Nas últimas semanas, o Brasil ficou envergonhado diante do mundo por causa de sete letras. A educação de base, conforme o Pisa, está entre as piores do mundo; segundo o IDH, temos a maior concentração de renda, pobreza persistente e saúde deprimente.
Esses dois indicadores mostram as mazelas de cinco séculos, 130 anos de república e sobretudo o fracasso da democracia nos últimos 33 anos. Demonstra que nós, democratas-progressistas, falhamos, não fomos capazes de reorientar o país na direção de um novo futuro. Deixamos 12 milhões de adultos analfabetos e 100 milhões sem saneamento.
Nós falhamos porque não criamos estratégias para que em poucas décadas o Pisa e o IDH estivessem entre os melhores do mundo. Ao lado da imagem da corrupção, esta é a nossa maior falha: não deixar uma bandeira fincada de como o Brasil seria um dia campeão em qualidade de vida.
Não fizemos isso porque estamos presos a ideias do passado; não percebemos que nestes tempos de “economia pelo conhecimento” a dinâmica econômica vem da formação dos trabalhadores e que a justiça social vem da igualdade no acesso à qualidade escolar. O caminho para a riqueza e para o IDH de seu país é não deixar qualquer criança para trás na sua educação.
Isso decorre de dois conceitos que nos amarram. Nós brasileiros não nos consideramos vocacionados para sermos campeões em educação. Somos um país com vocação para ganhar “bolas de ouro” com o melhor jogador do ano, não ganhar o Nobel com o melhor cientista do ano. Segundo, porque 350 anos de escravidão e 130 de desigualdade criaram no inconsciente coletivo dos brasileiros a ideia de que escola com qualidade é privilégio de ricos, raras exceções conquistadas e aceitas.
Nossa parcela rica se apega a esse privilégio como um direito seu. Nossa população pobre aceita mais a desigualdade na educação que sacrifica seus filhos do que a desigualdade no transporte público. Ela se incomoda mais quando olha de um ônibus cheio para um carro bacana ao lado, do que ao passar em frente a uma escola de ricos sem ao menos comparar com a pobre escola de seus filhos.
A tragédia do Pisa e do IDH será esquecida muito mais rapidamente do que o 2x1 que lembramos do Uruguai, em 1950, e do 7x1 da Alemanha, em 2014. Vamos esquecer e não vamos entender que o IDH baixo é produto da educação ruim e desigual refletida no Pisa.
Ainda é tempo. Daqui a dois anos completaremos 200 anos de independência. Ao longo do nosso terceiro centenário, se perdermos o complexo de inferioridade intelectual e oferecermos escola de qualidade para todos, ainda poderemos ser uma das grandes nações do mundo.
Cristovam Buarque é professor emérito da Universidade de Brasília.