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O protecionismo está novamente batendo à porta. Devido à pandemia, já são 83 os países e jurisdições que estão restringindo as exportações de aparelhos médicos e equipamentos de proteção individual, segundo levantamento do Global Trade Alert, projeto de monitoramento de política comercial de iniciativa do Centre for Economic Policy Research. Isto inclui proibições, limites quantitativos e direcionamento compulsório para compradores locais. São medidas desesperadas para combater a crise sanitária, mas que já ecoam em outras cadeias de produtos. Alguns países, por exemplo, aplicam medidas em fármacos e até em alimentos.

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Se a espiral de proteção continuar, as políticas de isolamento comercial vão ser cada vez mais comuns. Mas o protecionismo vale a pena em tempos de crise? A experiência mostra que não.

A Grande Depressão da década de 1930 – evento ao qual está sendo comparada em magnitude a crise econômica vindoura – foi agravada e prolongada pela desastrosa política comercial dos países na época. No mesmo ano, o Congresso dos Estados Unidos aprovou o Smoot-Hawley Tariff Act, que aumentou as tarifas em mais de 20 mil produtos. A reação do resto do mundo foi imediata e houve diversas retaliações, levando a um colapso do comércio internacional. Em um curto período de dois anos, o comércio total mundial se reduziu em aproximadamente 50%.

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A lição foi tão bem aprendida que, logo no início da crise financeira mundial de 2008, os países-membros do G20 foram a público se comprometer a não cometer o mesmo erro dos anos 1930. Esta coordenação global para não erigir barreiras comerciais foi um dos motivos pelo qual a crise de 2008 não foi pior.

Mas agora os tempos são outros. O impacto econômico da Covid-19 está dado. Em abril, o Fundo Monetário Internacional revisou suas estimativas para o PIB global e projetou uma queda de 3% para o ano de 2020, uma redução de 6,3 pontos porcentuais em relação à projeção do início do ano. O que está em jogo do ponto de vista econômico, a partir de agora, é o ritmo de recuperação da economia mundial. E sabemos que o comércio é uma variável chave nessa empreitada.

No entanto, a Organização Mundial do Comércio, em seu Trade Outlook 2020, já calcula que a retração do comércio mundial será de até 32% em um cenário pessimista. O seu diretor-geral, o brasileiro Roberto Azevêdo, foi bastante claro ao comentar os números apresentados: “Manter os mercados abertos ajudará as economias a se recuperarem mais plenamente”.

Olhando localmente, o Paraná conta com a abertura comercial como estímulo para sua economia de duas formas. Por um lado, o estado é conhecido por ser uma potência exportadora no agronegócio. Uma contração da economia e do comércio mundial significa menos demanda por produtos paranaenses. Se grandes compradores como China, Japão, Oriente Médio e Europa se virem em meio a restrições comerciais, haverá um impacto negativo nas exportações paranaenses. Além disso, um desalinhamento maior no Mercosul, por exemplo, pode comprometer a exportação de manufaturados – parcela não desprezível das exportações do Paraná – para os países do bloco.

Porém, o lado menos conhecido desta história é que dependemos também de nossas importações para sermos produtivos. Em 2019, de uma importação total de US$ 12,6 bilhões, 59% foram em bens intermediários, isto é, insumos. Estes produtos foram direcionados em grande parte para a própria agroindústria (químicos e fertilizantes), bem como para a indústria de transformação (químicos, componentes e peças). Fechar este fluxo de importação é fechar as portas para as indústrias mais dinâmicas do estado.

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É inevitável que muitas questões sejam repensadas frente ao impacto da pandemia. Cadeias consideradas essenciais vão sofrer pressão política, ainda que não econômica, para se deslocarem, seja para os países de origem ou para múltiplos fornecedores. Mas isso não deve ser motivo para colocar em risco o potencial de recuperação que o comércio mundial pode oferecer.

Neste sentido, a agenda internacional do governo federal deveria se tornar uma de suas prioridades. E o Paraná, pelas suas características comerciais, um apoiador de políticas de maior integração, para o seu próprio bem, e para que o Brasil e o mundo possam sair o mais rápido possível dos tempos difíceis que estão chegando.

Bruno De Lorenzi Cancelier Mazzucco é doutor em Desenvolvimento Econômico pela UFPR. João André Sarolli é mestre em Políticas Públicas pela Universidade de Chicago.