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Imagem do filme Todo mundo em todo lugar ao mesmo tempo.
Imagem do filme Todo mundo em todo lugar ao mesmo tempo.| Foto: Divulgação

Independente do resultado do Oscar neste final de semana, Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo já marcou o ano e fez história. Apesar de não ser uma unanimidade – sempre um ótimo sinal – o longa-metragem já pode ser considerado um pequeno fenômeno da cultura pop e encantou por onde passou, não há o que discutir. O filme já foi foi indicado em 358 premiações no mundo todo. Amealhou 335 vitórias. Uma performance que vai além do poder do marketing.

Uma das mais importantes prêmios foi o de melhor roteiro pela WGA, o prestigiado sindicato dos roteiristas norte-americanos, composto por integrantes que também votam em peso na Academia de Artes e Ciências Cinematográficas que organiza o Oscar. Mantidos o entusiasmo e a coerência, os diretores e roteiristas Daniel Kwan e Daniel Scheinert já podem espanar o lugar na estante para a calva estatueta de melhor roteiro original também. A discussão maior agora é outra: se o longa leva ou não o prêmio de melhor filme. O jogo está aberto.

Todos sabemos e sentimos, o mercado está saturado de fórmulas e filmes com roteiros que parecem ser escritos por ChatGPTs.

A concorrência é relativamente forte, mas não há favoritos. Tár é um belíssimo filme, provavelmente o melhor da carreira do diretor Todd Field, uma direção competentíssima, mas tem cara de cinemão antigo, falta-lhe frescor. O alemão Nada de Novo no Front vem forte, mas tem toda a cara de quem vai ficar apenas no prêmio de melhor filme estrangeiro e levará vários técnicos. Top Gun entrou na lista só para fazer o Tom Cruise botar um smoking . O hype do simpático Elvis já passou. Tudo indica que não está tão difícil para o filme dos diretores xarás Daniel Kwan e Scheinert.

Como em toda premiação, há questões de mercado maiores e mais prementes. Um prêmio de melhor filme para Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo consolidaria o status da A24, uma produtora que aposta na autoralidade e na criatividade desde sempre. Seria um grande recado da academia para que as outras produtoras americanas também ousem mais. Afinal, todos sabemos e sentimos, o mercado está saturado de fórmulas e filmes com roteiros que parecem ser escritos por ChatGPTs. A indústria do entretenimento pode ser mantida com fórmulas e filmes de super-heróis, mas nenhuma arte sobrevive sem ousadia e sem risco.

Infelizmente, a pauta identitária e o vitimismo tem apagado e reduzido o valor do filme. A lacração do filme é irrelevante. Ocorre que a turma progressista não pode ver uma possibilidade de pauta que logo sequestra uma obra. O filme é melhor e muito maior do que todos os universos que aborda. Não se trata apenas de uma obra sobre tolerância e aceitação das diferenças, mas uma grande reflexão de vida e autoaceitação de uma mulher de meia idade. Não há lacração, há pertinência. Há algo em algum lugar e em algum momento, mas não é a sua tônica.

Michelle Yeoh não está levando todos os prêmios de melhor atriz porque é asiática, mas porque realmente fez um trabalho brilhante. Uma pena levarem para este lado. Pouco importa se a própria atriz caiu na armadilha do marketing e acredita que está concorrendo por ser o peixe fora d'agua da premiação. O momento é tenso e poucas coisas são mais selvagens do que produtoras em campanha pelo Oscar. Brigas de rua são mais civilizadas.

Se todo este esforço dará certo, só saberemos no domingo. Até aqui vem funcionando bem e Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo pode fazer bonito levando pelo menos meia dúzia de suas impressionantes onze indicações. Sua vitória não seria algo bom apenas para o filme, e para a sua produtora, mas para o cinema comercial em geral. Também daria uma boa medida do quanto Hollywood está antenada e realmente preocupada com o seu próprio futuro.

Paulo Cursino é produtor e roteirista de Cinema.

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