A aids é uma síndrome infectocontagiosa causada pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV), que cursa com o comprometimento do sistema imunológico. Ela também se apresenta como um fenômeno social complexo, compreendendo em sua problemática mais fatores além do biológico. Estes, principalmente de ordem social, econômica e psicológica, são fundamentais para o entendimento da situação atual da epidemia e do porquê de ainda necessitarmos de um Dia Mundial de Luta Contra o HIV.
Estima-se que cerca de 718 mil indivíduos vivam com HIV/aids no Brasil. Isto é, a cada mil pessoas, quatro estão infectadas pelo HIV. E o pior: destas quatro, uma não sabe que tem a infecção. Em dados lançados em 2013 pelo Ministério da Saúde, nota-se que a Região Sul possui a mais alta taxa de casos novos de infecção pelo HIV em comparação com as outras regiões brasileiras. Além disso, o Sul lidera a taxa de mortalidade. As zonas portuárias de Porto Alegre, Itajaí e Paranaguá possuem um grande impacto no aumento dessas taxas. Há mais dados que chamam a atenção. Um exemplo: desde 2008 o número de novos casos em homens jovens tem aumentado em maior velocidade. Outra questão é que, apesar da diminuição global na taxa de infecção, há uma tendência de aumento de casos novos na faixa etária de 13 a 19 anos.
O Brasil enfrenta um novo desafio. A mortalidade pela doença ainda é alta. Pelo menos um terço dos pacientes fazem o diagnóstico em estágio avançado, e Curitiba não escapa a essa regra.
A terapia antirretroviral (Tarv), conhecida como "coquetel", não é um problema como muitos pensam. Fornecido gratuitamente pelo SUS, o tratamento inicial é realizado por meio de três medicamentos, uma vez ao dia. Se o coquetel é utilizado de forma correta, a expectativa de vida do paciente fica em torno de 79 anos.
Então, por que uma doença que possui tratamento eficaz apresenta taxas de infecção e letalidade ainda elevadas? Pelo preconceito, falta de atendimento capacitado na atenção primária e demora no atendimento com o médico infectologista. O preconceito é cruel e mata. No momento em que se formou o conceito de comportamento de risco, transferiu-se a responsabilidade do grupo para o indivíduo. Isso aumentou a culpa individual, reforçando o preconceito. O preço desse comportamento social é a não busca do diagnóstico pelo paciente, a vergonha e a não adesão ao tratamento. Aliada a isso, há uma escassez de profissionais capacitados e médicos infectologistas na rede pública. É comum o paciente esperar meses para uma consulta com um médico infectologista.
Em suma, a aids ainda é uma doença subdiagnosticada que mata e, apesar do tratamento eficaz, apresenta vários fatores que nos impedem de controlar a epidemia. Neste Dia Mundial da Luta Contra a Aids, sugiro ao leitor que faça duas coisas. Primeiro, procure qualquer unidade municipal de saúde e faça gratuitamente o teste. É rápido. Segundo, convido a repensarmos sobre o preconceito que todos carregamos e encararmos a aids como efetivamente ela é: uma doença biológica. Vamos despi-la do caráter punitivo e do castigo divino.
Hugo Manuel Paz Morales, especialista pelo HC-FMUSP, é médico infectologista do Hospital Santa Cruz.
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