A percepção distorcida em relação às queimadas na Amazônia tem provocado uma repercussão negativa para o Brasil no exterior, figurando, assim, o pretexto necessário para potencializar as manobras e barreiras não tarifárias criadas pelos nossos maiores concorrentes no mercado externo.
Não obstante as providências do Estado em controlar a situação, de acordo com os dados do Programa Queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), foram detectados por satélite, até o dia 26 de agosto deste ano, 42.719 focos ativos de queimadas, muito aquém do período entre 2004 e 2005, que atingiram, respectivamente, o ápice com 218.637 e 213.720 focos em atividade.
É imprescindível continuar estabelecendo diretrizes técnicas e assertivas para demonstrar a soberania nacional do Estado
Segundo Nota Técnica do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), o “fogo é um elemento comum na paisagem rural brasileira”, e a situação está sendo administrada pelo governo para conter os danos ambientais e penalizar eventuais responsáveis, prestigiando os princípios constitucionais da prevenção e precaução. Neste sentido, foi expedido o Decreto 9.985/2019, que encontra lastro constitucional (em seu artigo 142) e infraconstitucional (na Lei Complementar 97/1999), que autoriza, em caráter provisório e excepcional, as operações dos militares para Garantia de Lei e da Ordem (GLO) na Amazônia Legal. O escopo do decreto está no combate aos focos de incêndio, bem como na tomada de ações eficientes contra crimes e infrações ambientais na região, com a finalidade de preservar a ordem pública e a integridade da população, além de garantir o regular funcionamento das instituições.
Na mesma linha, foi expedida a Portaria 719/2019, dispondo sobre o emprego da Força Nacional de Segurança Pública, em apoio ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, do Ministério do Meio Ambiente, para o combate aos incêndios e desmatamento ilegal, com prazo até 31 de outubro de 2019, podendo ser prorrogado, se necessário.
Embora o número atual ainda não seja satisfatório, pode-se dizer que os trabalhos têm sido efetivos no combate às queimadas, tendo em vista que a soma no ano de 2017 foi de 107.439 focos, de modo que, comparativamente ao ano de 2019, houve uma redução substancial de 64.729 focos.
Portanto, não há duvidas de que a discussão não é pró-meio ambiente, mas exclusivamente política, em que há estratégia de enfraquecer a soberania nacional quando os países concorrentes enxergam oportunidade em descentralizar o controle do governo sobre a Amazônia, por meio do mecanismo de ofertar apoio financeiro, já utilizado em outras ocasiões.
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É imprescindível continuar estabelecendo diretrizes técnicas e assertivas para demonstrar a soberania nacional do Estado, garantindo maior segurança jurídica na adoção legítima de medidas preventivas e repressivas, bem como valer-se do momento para acolher a ideia da diplomacia ambiental no Brasil.
A ocasião é favorável para resgatar a essência de soberania da teoria de Bodin, com a razoabilidade das palavras do jurista Celso Ribeiro Bastos: “A soberania como fundamento do Estado brasileiro significa que dentro do nosso território não se admitirá força outra que não a dos poderes juridicamente constituídos, não podendo qualquer agente estranho à nação intervir nos seus negócios”.
Marcela Pitombo é advogada especialista em Direito Tributário e Agronegócio.