A adequação da legislação nacional para controlar a corrupção e o crime organizado transnacional é essencial para o desenvolvimento do país e para o fortalecimento do estado de Direito
Hoje, dia 1.º de fevereiro, uma nova legislatura se inicia no Brasil. Deputados e senadores eleitos em outubro do ano passado tomam posse para quatro e oito anos de mandato, respectivamente, e senadores eleitos em 2006 iniciam os quatro últimos anos de sua investidura.
Nessa data, que marca o começo do ano legislativo, é preciso que os representantes eleitos reafirmem seu compromisso com os esforços que vêm sendo empreendidos pelo Brasil para conter a corrupção. O início de um novo governo e de uma nova legislatura apresentam também o desafio de dar novos passos na construção de uma cultura de integridade e transparência.
O povo brasileiro vem exigindo de seus representantes uma postura de fato comprometida com a ética. O movimento Ficha Limpa evidenciou o desejo por integridade e demonstrou a força da mobilização social. O recado dos eleitores em 2010 foi claro: a corrupção não será mais aceita.
A partir de hoje, deputados e senadores têm a oportunidade de atender a essa demanda legítima da população, dando efetivo andamento a projetos de lei em trâmite no Congresso Nacional que buscam sentar bases para a construção de uma sociedade mais íntegra.
Esse é o caso do Projeto de Lei 5.586/2005, que tipifica o crime de enriquecimento ilícito quando o funcionário público possuir bens ou valores incompatíveis com sua renda, e do Projeto 7.528/2006, que define critérios e restrições para ocupantes de cargos públicos que tenham acesso a informações privilegiadas.
Outro importante projeto de lei a ser aprovado pelos parlamentares é o 5.228/2009, que trata da garantia do acesso pleno, imediato e gratuito a informações públicas, do estabelecimento de critérios para proteção das informações pessoais e sigilosas, assim como da isenção do servidor público de ser responsabilizado por informar as autoridades competentes sobre atos de improbidade ou crimes.
Não menos importantes são os projetos de lei 6.616/2009, que propõe tornar hediondos os tipos penais de peculato, concussão, corrupção passiva e corrupção ativa, e 6.826/2010, que trata da responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas por atos contra a administração pública.
Por fim, deputados e senadores terão a oportunidade de aprovar o Projeto de Lei 6.577/2009, que propõe alterações na chamada Lei de Lavagem de Dinheiro. O projeto determina infrações penais antecedentes à lavagem de dinheiro, amplia a lista de pessoas sujeitas a obrigações impostas pela mesma, cria o tipo penal "financiamento ao terrorismo" e permite a alienação antecipada de bens, direitos ou valores objetos dos crimes previstos nessa lei.
A existência desses projetos de lei demonstra que pelo menos uma parte da sociedade brasileira está consciente da necessidade de criar mecanismos para enfrentar a corrupção seguindo as convenções internacionais.
Todos os projetos citados acima atendem a recomendações contidas na Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção e na Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, ambas ratificadas pelo Brasil.
É fato que o Brasil tem realizado importantes avanços no tema. O desenvolvimento de iniciativas como o Portal da Transparência e a demissão de mais de 3 mil funcionários públicos envolvidos em atos de corrupção pela Controladoria-Geral da União, por exemplo, demonstram a preocupação do país com a devida aplicação do dinheiro público bem como com a responsabilização dos servidores envolvidos.
Mas o Brasil pode ser mais ousado. A adequação da legislação nacional para controlar a corrupção e o crime organizado transnacional é essencial para o desenvolvimento do país e para o fortalecimento do estado de Direito. É preciso ter consciência de que cada centavo desviado por atos de corrupção deixa de ser aplicado em melhorias para o povo.
Agora, esses representantes podem trabalhar e se empenhar na defesa dos reais interesses de seus eleitores, os mesmos que se mobilizaram no ano passado pela ética, pela integridade e pelo fim da corrupção.
Bo Mathiasen, dinamarquês, é o representante regional do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC) para o Brasil e o Cone Sul.
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