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Enquanto o verão é sinônimo de praia para alguns, para outros é o início de uma preocupação que sempre se repete: chuvas intensas e o medo de enchentes. Isso acontece porque as altas temperaturas da estação aumentam a umidade e deixam as nuvens mais carregadas, ou seja: chove mais e com mais intensidade, o que acaba deixando algumas áreas mais vulneráveis se não houver medidas preventivas.
Embora alguns fenômenos naturais sejam inevitáveis, a intensificação das mudanças climáticas e a falta de planejamento adequado agravam tragédias devastadoras que deixam marcas profundas na memória coletiva, tanto pelas perdas humanas irreparáveis quanto pelos danos materiais, cada vez mais difíceis de reconstruir em um cenário de crescente vulnerabilidade ambiental. Em 2011, a região serrana do Rio de Janeiro sofreu com um desastre que deixou 918 mortos, enquanto, em maio de 2024, no Rio Grande do Sul, 95% das cidades do estado foram atingidas, segundo a Defesa Civil.
A preparação para enchentes, no entanto, vai além da infraestrutura. Trata-se também de uma questão de justiça social e ambiental. O direito à cidade envolve garantir que todos, especialmente pessoas em situação de vulnerabilidade, tenham acesso a áreas seguras e bem planejadas
Anos antes dessa tragédia, em 2019, o governo estadual (gestão de Eduardo Leite) alterou quase 500 normas do Código Ambiental, permitindo a construção de barragens e outras obras em áreas protegidas. Em 2023, o prefeito reeleito de Porto Alegre, Sebastião Melo, não destinou recursos para a prevenção de enchentes, conforme o Portal da Transparência; em contrapartida, ele alegou que os recursos foram alocados para outras áreas.
Já em São Paulo, um blecaute causado por um temporal, em novembro de 2023 deixou a capital e região metropolitana sem energia por mais de uma semana. Mesmo assim, o prefeito (Ricardo Nunes) foi reeleito. Isso não é um juízo de valor individual dos governantes eleitos e reeleitos, mas nos sugere que essa ainda também não é uma prioridade da população na hora do voto. E chove chuva, chove sem parar…
Já passou da hora de as cidades se preparem com eficiência para lidar com esses desafios, ao mesmo passo que o eleitor também precisa olhar para essa questão como uma prioridade em suas escolhas políticas. Afinal, as enchentes no Brasil refletem um problema persistente causado pela urbanização desordenada e a falta de planejamento dos estados e municípios diante dos impactos das mudanças climáticas, afetando mais ainda as comunidades mais vulneráveis devido à ocupação de áreas de risco.
Essa situação só evidencia como é urgente tomar medidas eficazes que tornem as cidades mais resilientes, da melhoria dos sistemas de drenagem a políticas públicas de habitação e saneamento básico, que garantam condições dignas e seguras para todos. Existem exemplos, tanto no Brasil quanto no exterior, que demonstram como é possível enfrentar esse desafio de maneira eficaz.
Curitiba, por exemplo, se destaca pelo uso de infraestruturas verdes, como parques lineares que funcionam como áreas de drenagem natural. Em Roterdã, na Holanda, a cidade implementou "praças da água" em espaços públicos, que retêm a água durante chuvas intensas, ajudando a reduzir o risco de enchentes. Nas metrópoles brasileiras que enfrentam alagamentos anuais, é necessário integrar novas abordagens no planejamento urbano, como a construção de reservatórios subterrâneos, identificação de áreas de perigo e melhorias nos sistemas de drenagem pluvial.
A preparação para enchentes, no entanto, vai além da infraestrutura. Trata-se também de uma questão de justiça social e ambiental. O direito à cidade envolve garantir que todos, especialmente pessoas em situação de vulnerabilidade, tenham acesso a áreas seguras e bem planejadas. Também é necessário adotar uma abordagem participativa, envolvendo as comunidades no processo de busca por soluções, a fim de promover a conscientização sobre o manejo de resíduos e a preservação dos recursos hídricos. Enfrentar as enchentes de forma organizada e sustentável não só evita tragédias, mas também cria cidades mais resilientes e equitativas para todos. O momento de agir é agora.
Gabriela Sabino é secretária-executiva da Frente Parlamentar pelos Centros Urbanos no Congresso Nacional e ex-chefe de gabinete no Ministério de Portos e Aeroportos.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos