Quando Joe Biden venceu as eleições presidenciais de 2020, escrevi que seria um governo Obama III por se deparar com os mesmos problemas que o seu antecessor democrata enfrentou: um Congresso dividido e polarizado com os republicanos, uma economia em crise e um país fragmentado. Dois anos depois, o cenário se concretizou: democratas e republicanos perderam as midterms, as eleições de meio de mandato.
E o futuro de Biden e Trump não poderia ser mais claro: as urnas demonstraram o descontentamento dos eleitores norte-americanos com os nomes de seus presidentes mais recentes e a condução da maior economia do mundo. Biden, que hoje conta com uma das menores aprovações e popularidade em seu segundo ano de mandato, dá sinais de que enfrentará uma forte oposição republicana em 2024 e, antes disso, muito provavelmente em seu rachado Partido Democrata.
As urnas continuam dando os seus recados e a economia norte-americana continua sofrendo os impactos de escolhas políticas, internas e externas, mal pensadas ou mal executadas.
Já Donald Trump, um dos presidentes com maior reprovação da história recente dos Estados Unidos, não viu a sua onda conservadora se concretizar e também encontrou um Partido Republicano dividido. Me somo a outros cientistas políticos e internacionalistas que afirmam que Trump foi o grande derrotado das midterms, e com justa razão, pois não conseguiu capitalizar o voto conservador republicano, também viu uma amarga e apertada derrota no Senado e vitória na Câmara dos Representantes.
Assim como o eleitorado brasileiro, os norte-americanos demonstraram nas urnas o seu descontentamento com os nomes tradicionais de um sistema bipartidário que começa a dar sinais de um esgotamento há muito previsto. Candidatos independentes, de viés mais liberal, ambiental ou até mesmo conservador, foram o destaque nas eleições legislativas, e indicam que a fragmentada sociedade norte-americana anseia por um nome que a possa pacificar ou, ao menos, evitar um novo colapso da democracia, como aquele que testemunhamos na invasão ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021.
Nem Biden nem Trump representam esse nome, que não há de ser messiânico, mas sim pragmático, apesar de altamente ideológico. Do lado democrata, a vice-presidente Kamala Harris poderá ser a candidata natural em 2024, assim como do lado republicano, o nome que desponta das midterms é o do governador reeleito da Flórida, Ron DeSantis, que representa uma agenda ultraconservadora republicana. Tanto Harris quanto DeSantis, caso candidatos, deverão readequar o discurso para uma sociedade que quer de volta o seu poder de compra, direitos básicos sociais, como o acesso à saúde e à educação, e que pautas de costumes sejam respeitadas, seja quanto à diversidade, seja quanto à tradição.
Para Biden, os próximos dois anos deverão ser de certo alívio, ao menos no trato com o Legislativo: os democratas mantiveram a liderança no Senado e os republicanos liderarão a Câmara por uma margem de menos de quinze votos de maioria, conforme os últimos prognósticos. Pautas polêmicas exigirão uma manobra política com os dois partidos, enquanto programas econômicos que visem a recuperação do país serão a pauta da campanha de 2024 que já começou, em que pese os candidatos não estejam lançados.
Mesmo que Trump venha a ser candidato em 2024, deverá enfrentar uma forte oposição nas primárias republicanas e um grande sentimento de rejeição por parte da sociedade norte-americana. Por essas razões, seu futuro na política parece ser tão óbvio quanto o de Biden: a aposentadoria da Casa Branca. Enquanto isso, as urnas continuam dando os seus recados e a economia norte-americana continua sofrendo os impactos de escolhas políticas, internas e externas, mal pensadas ou mal executadas.
Roberto Georg Uebel é professor de Relações Internacionais da ESPM Porto Alegre. Doutor em Estudos Estratégicos Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e pós-doutorando em Geografia Política na UFRGS, tem como área de pesquisa temas da Geopolítica, Geoeconomia e Geografia dos Negócios Internacionais.
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