O assédio eleitoral no ambiente de trabalho, tema de crescente importância, ganha relevância em tempos de eleições, quando o empregador ou seus representantes podem se utilizar da hierarquia e do poder diretivo para influenciar a orientação política de seus empregados. A prática envolve o uso da estrutura empresarial de forma abusiva para coagir, intimidar ou forçar o trabalhador a apoiar determinado candidato ou partido político, sob ameaça de retaliação ou promessas de benefícios.
Conforme a Resolução 355/2023 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), assédio eleitoral é caracterizado como qualquer forma de distinção, exclusão ou preferência baseada em convicção ou opinião política no ambiente de trabalho. O ato pode ocorrer durante a admissão, permanência ou no exercício das funções laborais.
A liberdade de pensamento, garantida pela Constituição Federal no art. 5º, é um dos pilares da democracia. Dentro dessa liberdade está incluída a orientação política do trabalhador
O assédio pode envolver desde coação e intimidação velada até ameaças diretas de demissão ou promessas de benefícios para influenciar o voto dos empregados. O § único do art. 2º da Resolução também destaca que o assédio eleitoral visa manipular a manifestação política dos trabalhadores em prol de interesses partidários.
De acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT), mais de 153 denúncias já foram registradas desde o início da campanha, em agosto. No mesmo período, em 2022, foram contabilizados 11 casos de coação eleitoral. No entanto, o número total das últimas eleições foi alto: 3.606 denúncias de assédio de patrões a funcionários.
A Justiça do Trabalho também lançou uma campanha de combate ao assédio eleitoral no trabalho, denominada “Seu voto, sua voz - Assédio eleitoral no trabalho é crime”, promovida pela Justiça do Trabalho (JT) em todo o país. Recentemente, o TRT-10 promoveu ações de combate ao assédio eleitoral no ambiente de trabalho durante as eleições municipais de 2024.
As relações de trabalho naturalmente já se caracterizam por um certo desequilíbrio, derivado do poder diretivo do empregador, que pode gerar o chamado temor reverencial no empregado. No entanto, quando esse poder é exacerbado a ponto de forçar e obrigar o trabalhador a adotar uma posição política contrária à sua vontade, configura-se o assédio eleitoral.
A liberdade de pensamento, garantida pela Constituição Federal no art. 5º, é um dos pilares da democracia. Dentro dessa liberdade está incluída a orientação política do trabalhador. Qualquer ato de coerção praticado pelo empregador que tenha por objetivo forçar o empregado a votar de determinada forma fere esse direito fundamental e, por consequência, é considerado inconstitucional.
A prática de assédio eleitoral, por ser inconstitucional, é passível de sanções administrativas, civis e criminais. Entre as punições previstas estão multas e, em casos mais graves, penas de prisão. Sob o enfoque trabalhista, o empregado também pode pedir a rescisão indireta do contrato de trabalho, ou seja, romper o vínculo empregatício com o empregador, sem prejuízo dos direitos rescisórios, como se tivesse sido dispensado sem justa causa.
Além disso, o empregador ou o assediador pode ser condenado a indenizar o trabalhador por danos morais, devido ao abalo psicológico e à violação de sua honra e dignidade. Um exemplo emblemático foi a condenação de uma rede de varejo que obrigava seus empregados a utilizar camisetas com propaganda política e a participar de eventos eleitorais da empresa, sob ameaça de demissão.
Para evitar o assédio eleitoral, as empresas devem implementar normas internas que coíbam práticas abusivas e realizar treinamentos para conscientizar gestores e funcionários. A criação de canais de denúncia, como ouvidorias e comissões internas de prevenção (CIPA), também é essencial para promover um ambiente de trabalho saudável.
Caso o trabalhador seja vítima de assédio eleitoral, é fundamental que reúna provas, como mensagens de texto, e-mails ou testemunhos, e faça a denúncia aos órgãos competentes, como o Ministério Público do Trabalho (MPT), a Justiça Eleitoral, os sindicatos de classe e até mesmo na Justiça do Trabalho. Em muitos casos, essas denúncias resultam em condenações significativas, não apenas em prol do trabalhador individual, mas também em defesa de toda a coletividade.
A liberdade política é um direito inalienável e deve ser protegida em todos os espaços, inclusive no ambiente de trabalho. Empresas que promovem um ambiente saudável e respeitoso, livre de qualquer forma de assédio, tendem a ser mais produtivas e lucrativas, além de cumprir seu papel social e contribuir para o fortalecimento da democracia.
Ana Gabriela Burlamaqui, graduada em Direito, é especialista em Prevenção e Administração de Riscos Trabalhistas, e pós-graduada em Direito Digital, LGPD e Compliance Trabalhista; Liane Araujo Garcia é advogada trabalhista. Ambas são sócias do escritório A. C. Burlamaqui Consultores.
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