Muito se falou, no ano passado, sobre a Copa do Mundo no Catar. Além do futebol, outro assunto tomou conta das manchetes: o desrespeito às mulheres e ao público LGBT. Os debates representam um importante avanço, que mostra que o esporte não pode fugir das suas responsabilidades por um mundo mais justo e diverso. Agora, que temos outro evento chegando, precisamos voltar às discussões. Neste mês acontece a Copa do Mundo de Futebol Feminino, o que é, sim, um acontecimento para comemorar, já que as mulheres são desvalorizadas neste esporte. Mas, desta vez, é imprescindível falarmos da Austrália, um dos países que recebe a competição, ao lado da Nova Zelândia.
É um terrível exemplo de como uma nação pode ser inimiga de grupos sub-representados. É o que mostra o mais recente Relatório da Anistia Internacional. Começando pelos migrantes, é um dos piores locais para pessoas refugiadas em todo o mundo. Embora tenha aceitado uma oferta da Nova Zelândia para receber 150 delas anualmente, a prática de detenção em recintos e com práticas equivalentes a campos de concentração continua acontecendo.
Em alguns casos, as prisões já duram mais de 15 meses, um comportamento extremamente insensível com quem precisa de acolhimento após fugir, na grande maioria dos casos, de nações que enfrentam uma realidade muito mais complexa, como de guerra, desastres naturais ou miséria. Outro ponto que me espanta é a forma como tratam os povos originários, com total descaso e desrespeito. Os “aborígenes” – termo, contraditoriamente, significa “sem origem” – e os povos indígenas das Ilhas do Estreito de Torres seguem representados desproporcionalmente entre as pessoas encarceradas, comparando com o restante da população.
O estudo da Anistia Internacional traz, também, outra questão: o não direito à manifestação. Novas leis restringem protestos pacíficos em diversas regiões, com multas e penas pesadas, como o que aconteceu recentemente em Sydney. Após uma manifestação sobre a crise climática e contra a inação do governo neste sentido, mais de 20 pessoas podem ser condenadas a dois anos de prisão ou ao pagamento de até AUD22 mil, cerca de R$ 67 mil.
E, sim, sinto muito, mas pode piorar: a maioridade penal australiana é de apenas dez anos! Crianças de povos originários, que compõem 6% da população, por exemplo, são quase 50% dos jovens detidos. Casos estarrecedores de automutilação, tentativa de suicídio e abuso físico e sexual foram relatados à Anistia Internacional. Precisamos, urgentemente, de avanços em Diversidade, Equidade, Inclusão e Pertencimento (DEIP) na Austrália. Não podemos ignorar estas violações, como se nada estivesse acontecendo, apenas porque a Copa do Mundo chegou em um país de ascendência branca e britânica na sua maioria. Precisamos conhecer e dar visibilidade a estas violências, para que mudanças positivas sejam possíveis no futuro – e que seja breve.
Keyllen Yazmin Nieto é fundadora e consultora sênior da Integra Diversidade.
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