"Esse é o grande destino do homem: remover os escombros criados pelo Ódio e partir de novo, no vento da Liberdade, para frente e para cima." (Vinicius de Moraes, Hino Carioca – 1966)

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Decorridos dez anos dos atentados às torres do World Trade Center, em Nova York, e ao Pentágono, em Washington, três situações podem ser diagnosticadas: a errônea criminalização do islamismo, a estratégia equivocada da política exterior dos Estados Unidos (EUA) e um retrocesso dos direitos e garantias fundamentais.

A comoção mundial e a ânsia da população dos EUA em identificar e punir culpados levaram o governo a identificar o terrorismo com o islamismo. Sendo Osama bin Laden o mentor dos ataques de 11 de setembro de 2001 e sendo seus discípulos ou seguidores os executores de atentados terroristas posteriores (Madri, 2004, e Londres, 2005), sob a alegação de estar defendendo os muçulmanos das investidas bélicas anteriores dos EUA e seus aliados, a aproximação de uma minúscula célula terrorista com o amplo mundo de seguidores do Islã foi imediata, mostrando-se muito conveniente para o mundo americano, mas muito injusta com o mundo árabe.

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Já a falência do sistema de defesa norte-americano, que não conseguiu detectar nem impedir os ataques em 2001, exigia a opção por uma estratégia multilateral de proteção da sociedade internacional e de repressão ao terrorismo, com ampla cooperação entre os Estados e com base no Direito. Foi exatamente o oposto que aconteceu: as pretensões hegemônicas dos EUA geraram ações unilaterais, com total desrespeito às posições da maioria dos países e à opinião da própria ONU – a organização intergovernamental criada justamente para organizar a paz e segurança internacionais. Além disso, os EUA insistiram no uso da força, seja no Afeganistão, seja no Iraque, provocando a ira de pessoas relacionadas a territórios, culturas e religiões totalmente diferentes do Ocidente. As opções apresentadas pelo Direito Internacional foram completamente rechaçadas: os EUA continuaram a ignorar a possibilidade de realização de tratados internacionais (inclusive sobre terrorismo) e mantiveram sua retrógrada posição contrária à instauração do Tribunal Penal Internacional. Este foi estabelecido com jurisdição inclusive para julgar pessoas que cometem "crimes contra a humanidade", nos quais facilmente se enquadrariam os terroristas, caso houvesse interesse em fazê-lo.

Cabe salientar, ainda, que houve uma grande perda no que diz respeito aos direitos individuais não só dos americanos, mas também de estrangeiros que tenham alguma relação com o país. O Ato Patriótico ("USA Patriotic Act") foi editado ainda em 2001 com o objetivo de facilitar a captura dos terroristas e, para tanto, permite a investigação pelo governo norte-americano de qualquer suspeito, afastando a necessidade de autorização para realização de grampo em telefones, revistas em pessoas e bens, interceptação em comunicações (internet, fax etc.) e consulta a contas bancárias. Também é possibilitado efetuar prisão, em delegacias ou locais militares, sem oferecer o direito a advogado ou sem formalizar a acusação. Os estrangeiros, que em decorrência daquele ato poderiam ter a saída compulsória decretada com grande facilidade, encontram cada vez mais dificuldade de entrar, passar ou permanecer nos EUA. E o mais crítico é que todas essas facilitações foram amplamente utilizadas pelos diversos órgãos do governo dos EUA nos últimos anos.

Além da lamentável perda de milhares de vidas, os atentados de 11/9 também trouxeram outras vítimas: a liberdade, a democracia e o Direito. Ao pensamento do poeta, para quem o destino dos homens deveria ser a liberdade, acrescentamos que o destino das nações deveria ser sempre a democracia e o direito.

Tatyana Scheila Friedrich é professora de Direito Internacional Privado da UFPR.