As eleições de 2006 reconduziram o presidente Lula ao governo federal, mas em uma campanha relativamente vazia quanto a discussões sobre reformas para o próximo mandato. Tirando menções superficiais a uma reforma política e a possibilidade de retomada das privatizações, pouco se falou sobre propostas de mudança para o futuro. Discutiu-se mais sobre o passado nestas eleições, do que sobre o futuro.
Mas por que a maioria dos eleitores achou a administração petista melhor? Primeiro porque a qualidade de vida de uma parcela significativa da população brasileira melhorou. No segundo turno, e essa é a segunda parte da resposta, se juntaram a esse setor grupos de classe média que estavam desiludidos com o partido, mas que, no momento decisivo, não conseguiram apoiar a oposição. Ou seja, ideologia e pragmatismo levaram à vitória do PT nas eleições.
Mas qual o motivo da desilusão de setores que sempre apoiaram o projeto petista? Além da indiscutível decepção ética, um outro fator que magoou a base petista de classe média foi a aprovação de uma única reforma constitucional no primeiro mandato: a reforma da previdência. Ela foi tão ou mais radical do que a proposta pelo governo anterior do PSDB e que incluía medidas extremamente polêmicas, como a taxação dos aposentados, a que o PT sempre se opôs.
Ou seja, a reviravolta programática petista na reforma da previdência foi o começo de um longo processo de desilusão da base do partido, que se acentuou com os seguidos escândalos de corrupção que proibiram o governo de discutir e aprovar outras propostas de reforma no Congresso e que agora, mais uma vez, voltam à tona e passam a ser chave para o sucesso do segundo mandato petista.
E quais são as propostas e a perspectiva para que elas sejam aprovadas no Congresso? Primeiramente, vale destacar que o governo Lula terá que ser muito ágil na discussão e aprovação das propostas enviadas. O próximo governo tem, com certa segurança, aproximadamente um ano e meio para aprovar os pontos principais da sua agenda. O começo do período eleitoral de 2008, com as eleições municipais, será o início do término do segundo mandato de Lula.
Após o período eleitoral, o segundo ano do governo Lula terá terminado e, a partir do terceiro, a disputa pela sucessão ganhará destaque. Nesse momento, as condições para a aprovação de propostas no Congresso se tornam mais incertas. Se o governo estiver obtendo sucesso e um alto grau de popularidade, então a oposição se enfraquece e Lula terá uma sobrevida de um ano para tentar aprovar mais projetos. Caso contrário, a oposição endurecerá e o leque de manobras do governo se encurtará, reduzindo sua capacidade de influenciar o processo decisório no Congresso. Já no quarto ano do segundo mandato, as chances de negociação com o Congresso diminuem exponencialmente. Ou seja, o governo terá que ser ágil na apresentação de suas propostas.
Quais são os principais temas dessa agenda? Sem dúvida, a reforma tributária ganha destaque. A proposta atualmente em tramitação prevê várias mudanças, como simplificação do ICMS, prorrogação da Desvinculação da Receita da União e continuação da CPMF. Provavelmente esse pacote será desmembrado para aprovar mais rapidamente os dois últimos pontos. Há também pontos sobre a redução de impostos dos setores produtivos, principalmente desonerando exportações.
Além da reforma tributária, também a reforma política será discutida, com base no relatório aprovado pela Comissão Especial que analisou o tema em 2003. Outras reformas que poderão ter espaço na agenda são a trabalhista/sindical e um retorno à discussão sobre a reforma da previdência, grande parte dela não regulamentada por leis complementares.
Mas o que garante que o governo Lula conseguirá obter apoio nesse curto espaço de tempo que dispõe? As dificuldades são grandes, já que sua coalizão é bastante heterogênea. Há prenúncios já no atual Congresso, nestas últimas semanas, que permitem formular algumas expectativas. O governo conseguiu aprovar projetos importantes, como a Lei das Micro e Pequenas Empresas e o Fundeb, mas teve derrotas e incômodos, principalmente no Senado.
Controlar postos-chaves na hierarquia interna do Congresso, principalmente no Senado, como a presidência das duas casas e presidentes de comissões importantes passa a ser fundamental. Como parece ser no Senado que o governo encontrará oposição mais acirrada, a recondução de Renan Calheiros à presidência é de vital importância para bloquear ameaças e negociar a aprovação de uma agenda bastante ampla de reformas.
Lucio Rennó é PhD em Ciência Política pela Universidade de Pittsburgh e professor adjunto do Centro de Pesquisa e Pós-Graduação para as Américas (Ceppac) da UnB.
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