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Opinião do dia 1

Avanços republicanos

A sociedade se movimenta e as instituições se mexem: sem fogos, confete e festas, de repente, uma sucessão de avanços a comemorar. A melhor notícia é que as boas novas têm muitos autores, foram produzidas em diversas esferas e não saíram apenas dos laboratórios do otimismo oficial. A República avisa que existe.

A decisão do Supremo Tribunal Federal em limitar as paralisações dos servidores públicos acaba com o sindicalismo selvagem. A população não pode continuar no pelourinho, castigada porque os metroviários ou os médicos ou os policiais reclamam um aumento que o estado não quer atender.

A garantia de serviços mínimos em paredes de servidores é adotada há muitas décadas em países europeus cujo sindicalismo é mais antigo, mais estruturado e mais autêntico do que o nosso. Recusar paradigmas renovadores é um compromisso com o retrocesso.

A origem da decisão não desmerece seu mérito. A suprema corte é um tribunal constitucional, cabe a ele dirimir pendências relativas à interpretação das leis. Sobretudo quando outros poderes se omitem e procrastinam soluções de interesse público como essa que tramita no Congresso há 19 anos. Os sindicatos não perderam o seu poder de barganha, os trabalhadores não saíram prejudicados, ao contrário, legitimaram-se ao reaproximar-se da sociedade.

Na mesma área sindical, o Congresso, ultimamente tão acabrunhado, também tenta fazer o seu gol. Na semana passada, a Câmara aprovou a Emenda 21 ao projeto de lei oriundo do Executivo que acaba com o recolhimento automático em folha do imposto sindical. O assunto agora deve subir para o Senado. O PT está dividido, os históricos acreditam que o fim deste desconto automático será decisivo para liquidar os restos de peleguismo e o corporativismo herdados da Era Vargas (1943) inspirados no fascismo italiano.

Deve ser saudada por todos os democratas a ousada decisão do PSDB de demarcar-se dos DEM (do Democratas) e negociar com o governo alterações substantivas na CPFM de modo a permitir a sua prorrogação. É simplesmente suicida, anticívica, a intenção de liquidar sumariamente o chamado "imposto do cheque", pretendida pelos ex-pefelistas. Nem os empresários a aceitam.

São bem-vindas todas as tentativas de concertação política, o país só avançará quando adversários conseguirem vencer seus preconceitos e rancores, para encontrar pontos de convergência e aproximação. Só se acabará com a aberrante troca de votos por verbas (que caracteriza a ligação PT-PMDB), quando setores responsáveis do governo e da oposição sentarem-se para conversar e negociar.

Quem ganha com o radicalismo delirante e com os impasses por ele gerados são os fisiológicos, os oportunistas que fazem qualquer negócio. Uma República entalada num beco sem saída é o sonho dos totalitários.

Sérgio Cabral Filho, governador do Rio, também lavrou um tento. Ainda que suas declarações à "Folha" (quinta, 25/10) sobre fertilidade e favelas tenham sido confusas, impróprias (por isso corrigidas nesta sexta com outro depoimento), é corajosa sua opção em levantar formalmente o debate sobre o aborto.

A necessidade de criar meios legais para interromper a gravidez torna-se gritante diante do aumento do noticiário sobre recém-nascidos jogados no lixo por mães despreparadas para a maternidade. Essas mães-assassinas não fabricam os marginais de amanhã, não são parceiras da bandidagem, são vítimas de uma sociedade narcotizada pelos dogmas e pela crendice.

A CNBB, representando o catolicismo brasileiro bem como outras centrais religiosas, tem o direito de preocupar-se e protestar contra a crescente conscientização da sociedade brasileira na busca para encontrar formas de legalizar o aborto. No entanto, é imperioso lembrar que o Brasil é um Estado secular, não teocrático. Essa constatação, aparentemente óbvia, deve ser reafirmada todos os dias, em todas as ocasiões.

Somos uma república secular, ao contrário de outras, de fachada, ainda atreladas a estruturas e métodos medievais. A completa separação entre as esferas temporal e religiosa será benéfica para ambas. Colocar a questão do aborto na agenda nacional é uma prioridade que não pode ser recusada.

A República avisa, ela existe. Não existe melhor forma de comemorar seus 118 anos no próximo dia 15 do que estimular todos os esforços para torná-la efetivamente uma coisa pública.

Alberto Dines é jornalista.

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