A confirmação oficiosa da absolvição do senador Renan Calheiros das trapalhadas em que se enrolou com a aventura extraconjugal e os acertos e desacertos para o pagamento da pensão para a mãe e a filha de três anos – a única de imaculada inocência no episódio constrangedor – não justifica surpresa e dispensa a indignação, tão escassa no mercado da decadência moral do Congresso.

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Sobra o desacerto entre as versões e a lógica que se embaralha nos prazos que não combinam com as explicações e na dança dos atrasos.

Louve-se o agudo senso de oportunidade do Senado ao pegar carona na crise que roncava nas suas vísceras, para aprovar protegido pela neblina do incidente os dois decretos legislativos que reajustam os subsídios parlamentares e vencimentos do presidente da República e dos ministros em 28,81%.

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Não era o caso para tais pudores em casa tão pouco cuidadosa com a sua respeitabilidade. E fica parecendo um truque bobo para enganar o distinto eleitor que anda a xingá-la no vexaminoso índice de confiança da última pesquisa. Para que aproveitar um momento de desatenção do plenário vazio e encaixar na pauta a dupla de projetos e aprová-los às carreiras, por votação simbólica?

Na cascata de astúcias desperdiçadas esconde-se o drible da insaciável ganância dos que gostam de levar vantagem. Ora, o aumento dos subsídios parlamentares de R$ 12,7 mil para 16,5 mil, retroativo a 1.º de abril, corrige a mordida da inflação. E os subsídios representam na orgia das mordomias, vantagens, benefícios e mutretas, uma fatia irrelevante do saque nos cofres da viúva.

No caso do presidente, vice-presidente e ministros a pirueta dos vencimentos raspa na hipocrisia: reajuste para R$ 11,4 mil para os vencimentos do presidente e do vice e, para R$ 10,7 mil para ministros e secretários.

Certamente que não é por sair que se estanca a sangria do dinheiro público.

O senador Renan Calheiros nem por um minuto esteve ameaçado de qualquer punição, da simples advertência verbal ao exagero da cassação do mandato, pela sua aventura amorosa, complicada pelos acertos para o reconhecimento da paternidade e o pagamento de pensão alimentícia e despesa com a educação.

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O que não se consegue entender é o branco na memória do bravo representante de Alagoas que simplesmente se esqueceu que dispunha dos documentos para comprovar que honrara os seus compromissos. Na quase meia hora do seu discurso emocionado, desculpou-se alegando que não tinha como provar todos os pagamentos, com os extratos dos depósitos bancários e as declarações ao Imposto de Renda. No dia seguinte, os seus advogados entregaram a papelada à Corregedoria do Senado.

Lá no cantinho abandonado da oposição, o minúsculo PSol tentou estragar a festa, protocolando em cima da hora, o pedido de abertura de inquérito por quebra do decoro parlamentar.

Para não deixar nenhuma brecha, a maioria tratou de calafetar a fenda: instalou o Conselho de Ética do Senado e elegeu para a presidência o bravo senador Sibá Machado, que ocupa a cadeira da senadora Marina Silva, ministra do Meio Ambiente.

O representante petista do Acre, inflado de vaidade, deu o seu recado enérgico adiando para a próxima semana a primeira sessão do órgão. Ficou claramente entendido que depende do exame da documentação que inocenta o senador Renan Calheiros.

Tudo como manda o figurino. A propósito: estimativa da Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça calcula em R$ 40 bilhões anuais o rombo com obras públicas superfaturadas.

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Acordou tarde.

Villas-Bôas Corrêa é analista político.