Tornou-se senso comum afirmar que devemos equilibrar conservação ambiental, garantias sociais e viabilidade econômica em prol do desenvolvimento sustentável. Todavia, quando acompanhamos debates acerca de nossas regras ambientais, temos a sensação de que, ao invés de estarem no mesmo time, os agentes dos chamados “pilares da sustentabilidade” agem como rivais tentando se sobrepor um ou outro.
Pode-se afirmar que os ganhos ambientais foram consideráveis nas últimas décadas, desde o código florestal, com sua confusa e genérica, porém indispensável, determinação de Áreas de Preservação Permanente, mas principalmente com uma lei fundamental que estabelece o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc). Dentre seus objetivos, assim como a conservação e preservação de hábitats, espécies e recursos naturais, estão a promoção do desenvolvimento sustentável e a valorização econômica e social da diversidade biológica.
Os ganhos ambientais foram consideráveis nas últimas décadas, desde o código florestal
Com o Snuc, haveriam garantias de que áreas com relevância ambiental seriam conservadas e também que populações que extraem desses ambientes a sua subsistência teriam seus direitos observados. Infelizmente, na prática, a teoria tem sido outra. Ainda que tenhamos hoje algo como 17% de nosso território protegido por unidades de conservação (UC), a distribuição é desequilibrada e perigosamente baixa em alguns biomas.
Também instaurou-se um terrorismo verde desnecessário, por conta da insegurança jurídica de terras inseridas em UCs, muitas vezes decretadas, mas não efetivadas em razão da ausência de planos de manejo – espécie de plano diretor de UC, que determina, entre outros, usos pretendidos na unidade –, assim como problemas de propriedade, dado que a maioria das categorias de UCs são públicas, não prevendo propriedades privadas em sua área, o que significaria dizer que todos os proprietários do local deveriam ser desapropriados e, portanto, indenizados.
Criou-se então o Fla-Flu Ambiental: ruralistas e ambientalistas se enfrentando, enquanto nosso legado para a garantia de vida das gerações futuras se esvai perante nossos olhos. Os erros de um lado são justificativas para medidas arbitrárias do outro. A nova onda de desafetação de áreas baseia-se em categorizações (enquadramento em uma das categorias de UC) alegadamente equivocadas do passado. Porém, ao invés de se solicitar recategorizações, ou ainda criação de mosaicos de UCs, busca-se que sejam desafetadas e, portanto, desprotegidas.
Há ainda outros casos mais estranhos à lei atual, cuja proposta é de se criar novas categorias de unidades para garantir benefícios específicos dentro de UCs. Dentre tantos exemplos, nesse contexto complexo se enquadra a reabertura da Estrada do Colono no Parque Nacional do Iguaçu. Sua retomada exigiria a destruição de hábitats em plena recuperação, e uma abertura perigosa de precedentes.
Essa guerra de forças no âmbito ambiental, absolutamente inconveniente, nos leva a perda de oportunidades para parcerias público-privadas em prol da proteção de nossos biomas, e ao desperdício de um potencial extraordinário de serviços ecossistêmicos promovidos pelos ambientes naturais. Lamentável que os lados dessa mesma moeda não percebam que quem está perdendo, em última instância, não é só o verde, mas também o vermelho, o azul e todas as outras cores.
Marlos Hardt, doutor em Gestão Urbana, é professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
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