Poucos anos atrás, uma das afirmações mais ouvidas sobre bancos públicos era sua importância em momentos de necessidade de atuação anticíclica. Instituições financeiras como Banco do Brasil (BB), Caixa Federal (CEF) e BNDES teriam um papel crucial durante crises econômicas, pois atuavam quando bancos privados se retiravam do mercado devido ao risco de curto prazo e incertezas. Especial ênfase ganhou o BNDES em 2009 e anos seguintes: na concepção de alguns, tornou-se praticamente um herói nacional para manter o Brasil longe da crise financeira mundial, sendo até apontado em artigos de opinião como exemplo de solução para países em desenvolvimento e principal motivo de a crise internacional ter sido somente uma “marolinha” no Brasil. Foram anos em que o governo federal chegou a determinar a queda dos juros no BB e na Caixa, como se isso fosse plausível para dois bancos que competem em um mercado de grandes bancos privados.
Agora a “onda” é outra: o BNDES passou a ser alvo de críticas quanto ao seu papel na economia brasileira e está no meio de uma discussão sobre a chamada “bolsa empresário” e subsídios de juros para o setor empresarial produtivo. Incrível a capacidade de ir de um lado para o outro com informações distorcidas. Destaca-se o aumento do pagamento de subsídios, inclusive em 2016, já com a atual gestão federal, e simplesmente esquece-se de que o aumento dos subsídios financeiros em 2016, 2017 e próximos anos é decorrente principalmente dos programas de juros fixos (que nada têm a ver com a TJLP) criados no fim de 2008, notadamente para financiamento da aquisição de bens de capital. Foram linhas com juros de até 2,5% ao ano, com prazo de dez anos. Financiamentos concedidos no fim de 2008 ainda estão custando para a sociedade, pois os subsídios a esses contratos terminarão apenas em 2018. E, se os juros do contrato são 2,5% ao ano, enquanto a taxa Selic superou 14% ao ano, imaginem quanto esses programas custaram em 2016 para o Brasil.
Neste momento parece haver quase que uma abdução coletiva sobre o que se quer de instituições financeiras públicas
Fato é que não há estudos conclusivos sobre o real resultado proporcionado pela atuação anticíclica do BNDES e outros bancos públicos que possam amparar o otimismo com essas instituições nos anos anteriores, como também é fato que o custo dos subsídios não necessariamente tem a ver com a política de atuação de instituições como o BNDES: são decisões de governo para criar estímulos e que custam para a sociedade. O BNDES continuaria cumprindo seu papel, haja vista o que está ocorrendo em 2017, mesmo sem os subsídios desproporcionais e continuados estabelecidos nos anos anteriores.
Hoje, de forma absolutamente técnica e condizente com as melhores práticas financeiras de risco, rediscute-se a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), cujo subsidio é bancado também pelo trabalhador, por meio do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Criou-se a Taxa de Longo Prazo (TLP), que deixa de ser uma taxa politicamente decidida para ser uma taxa que acompanha a inflação e as expectativas de risco de longo prazo. Também está se ajustando o tamanho do orçamento do BNDES, para redirecioná-lo a prioridades de Estado, como, espera-se, financiamento parcial a projetos de infraestrutura e projetos de investimentos produtivos, especialmente de micro, pequenas e médias empresas. Todavia, ainda não se rompeu com programas que pouco alinhamento têm com o papel de desenvolvimento do BNDES, como é o Progeren, programa que financia capital de giro no longo prazo. Este programa já poderia ter sido reduzido de forma a privilegiar os programas direcionados a investimentos em ativos fixos produtivos e o aumento do orçamento de bancos que atuam para fomentar esses investimentos, como o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE). Imagina-se que o Progeren não foi ainda reescrito por estarmos em um momento de atuação anticíclica e de preocupação com a liquidez das empresas.
Mas, apesar da necessidade desses ajustes, neste momento parece haver quase que uma abdução coletiva sobre o que se quer de instituições financeiras públicas. Ou alguém tem dúvida da importância do BB, com sua enorme rede de agências espalhadas por todo o país, fazendo crédito rural e proporcionando cidadania para muitos brasileiros? Ou da importância da Caixa para o crédito imobiliário: bancos privados tomariam esse risco no Brasil com recursos próprios?
Leia também: Maria Silvia e o BNDES (editorial de 30 de maio de 2017)
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Talvez poucos saibam, mas o BRDE tem linhas de crédito para investimentos empresariais que não têm subsídios, e, mesmo assim, com custo muito abaixo da média dos bancos: a operação mais cara do BRDE nos últimos 12 meses custou 1,32% ao mês, enquanto o crédito para pessoa jurídica no Sistema Financeiro Nacional (SFN) custa, na média, 1,84% ao mês, conforme dados de junho de 2017 do Banco Central. E o orçamento do BRDE é totalmente independente dos seus estados controladores (os três estados do Sul do Brasil), ou seja, sem custos para a sociedade. Mesmo a única capitalização das últimas décadas, no valor de R$ 400 milhões, realizada por Paraná e Santa Catarina, foi com o objetivo de o banco ofertar mais crédito para investimento, e não para custeio ou cobertura de perdas. É um banco superavitário que mantém R$ 14 bilhões girando na economia do Sul do Brasil, que reaplica na própria região todo montante que retorna dos financiamentos concedidos, bem como aplica integralmente em crédito o resultado que alcança. Possui inadimplência menor que a média do sistema financeiro (2,7% em junho de 2017, contra 3,7% da média do SFN). É o maior repassador do BNDES de crédito direcionado a investimentos e o maior operador do Brasil de recursos de inovação.
Mas está aí uma boa pergunta: por que é o maior operador com tantos outros bancos, privados, aptos a operar os mesmos produtos? A resposta é simples: porque tem foco em financiar investimentos produtivos diferenciados, necessários para a economia do Sul, com rigor na análise técnica e práticas reconhecidas como sendo as melhores. Motivos estes suficientes para a manifestação de representantes das principais entidades do setor produtivo paranaense (G7) e de representantes de governo do estado, reconhecendo a importância estratégica de manter um banco de desenvolvimento próprio como o BRDE.