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A nossa literatura tributária de meio século atrás, a propósito da ambiência jurídica da época, apresentava em artigos e livros uma titulação que era síntese do que ocorria: nosocômio tributário, hospício tributário, clínica fiscal.

Cinqüenta anos depois, já há indícios veementes de que convém, em apelo à ciência médica, revitalizar essas antigas instituições destinadas a dar tratamento especializado ao comportamento ensandecido dos nossos legisladores. Dada a insensatez e alucinação que orientam a fixação da intensidade da carga tributária, estabelecer outros centros médicos para atender o destinatário final dos nossos impostos e contribuições, vítima de sangria desatada das suas energias vitais, em processo agravado de anemia. Para esse último, o padecente tributário, parece conveniente colocá-lo em clínicas de repouso, para que se recupere do depauperamento decorrente da extorsão tributária a que tem estado submetido.

Já o legislador tributário necessita com urgência de ser internado em nosocômio ou hospício, para entrar nos eixos, readquirir a sensatez, a racionalidade e conter a volúpia arrecadadora alucinada, que tem caracterizado o seu comportamento nos últimos anos. Dito isso, é necessária a realização de uma pausa para dizer precisamente quem vai efetivamente ser internado nas instituições destinadas à cura da mente.

Evidente que não são os congressistas, os destinatários dessa internação, representantes do povo na Câmara e no Senado. Em matéria tributária, a produção das normas tem sido realizada por meio de instrumentos típicos do Poder Executivo. O Congresso omitiu-se nesse campo, e a usurpação na edição de instrumentos normativos pelo Executivo, feita na ditadura militar via decretos-leis, atualmente é materializada por meio de medidas provisórias.

Parece que o orientador do Executivo é o Sílvio Santos, criador do programa "Topa tudo por dinheiro". Ou que, na casa da alegria, onde se reunia a turma de Ribeirão Preto, componente da assessoria do finado ministro Palocci, forjou-se a teoria da Joana da Silva, a que faz de tudo, serviço completo, desde que haja pagamento.

Há notícia de que se prepara no Congresso Nacional mais um bacanal tributário, que o Tiago, meu copy-desk particular, acha ser de inadequada utilização em artigo técnico. Vá lá, seu Tiago, faço a modificação para tornar mais palatável o que está sendo engendrado – coquetel tributário – é a designação eufêmica para conjunto de anistia, parcelamento, compensação, transação, remissão, que já foram objeto de refinanciamentos de débitos perante a Receita Federal e a Previdência Social, intitulados Refis 1 (2001) e Refis 2 (2003).

Se de tempos em tempos, há necessidade de amparar os que não pagam os tributos devidos, é obvio que a questão envolve algo mais complexo: a permanente e crescente complexidade do conjunto de tributos e elevação potencializada de carga tributária, que tem um efeito anárquico: a indução pelo ordenamento jurídico à evasão e à sonegação, posto que o padecente tributário não almeja a santidade ou a idiotia. Se para sobreviver tem de se utilizar desses mecanismos espúrios, vai efetivamente utilizá-los. É um fato da vida, a luta para a preservação da espécie. A realidade é que não se atacam as causas. Esse Refis 3, que vai surgir como benesse tributária, em ano eleitoral, representa colocar band-aid em tumor cancerígeno.

Osíris de Azevedo Lopes Filho, advogado, é professor de Direito na Universidade de Brasília (UnB) e ex-secretário da Receita Federal.

osirisfilho@azevedolopes.adv.br

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