Em sua primeira declaração desde que a Câmara dos Deputados autorizou seu processo de impeachment, a presidente Dilma Rousseff, armada de falsa indignação, posou de defensora de uma democracia supostamente ameaçada. “Na minha juventude, enfrentei a ditadura por convicção e agora eu também enfrento com convicção um golpe de Estado”. Mentira. Cinismo. Bofetadas na Constituição, no Congresso e no Supremo Tribunal Federal.
Do alto de sua arrogância patológica, Dilma dá uma banana para milhões de brasileiros que, legítima e democraticamente, querem sua saída. A sociedade quer virar a página. Ninguém aguenta mais o discurso de vitimização de Dilma Rousseff. Seu desgoverno jogou o Brasil no dramático ambiente de uma UTI fiscal. A máquina administrativa está parada, o desemprego aumenta, o investimento sumiu. A crise econômica não tem precedentes. Caso o impeachment da presidente Dilma Rousseff venha a ser consumado pelo Senado, a recuperação da economia será prioridade de Michel Temer.
Temer precisará dar um sinal claro, inequívoco, capaz de tranquilizar a opinião pública
Mas o novo governo não poderá menosprezar, no campo político, a principal demanda da sociedade: o combate à ladroagem. A postura do governo Temer diante da luta contra a corrupção e, em especial, da Operação Lava Jato será rigorosamente monitorada pela imprensa e pela cidadania. E devido a razões óbvias. Como tem mostrado exaustivamente a Lava Jato, o PMDB do vice-presidente é, ao lado do PT e do PP, partido amplamente beneficiado no petrolão. Parte dos muitos milhões roubados do caixa da Petrobras por meio de um esquema em que diretores da estatal apadrinhados por políticos assinavam, com empreiteiras pré-escolhidas, contratos superfaturados foi para peemedebistas.
O estreito relacionamento entre Romero Jucá e Michel Temer levanta justificáveis temores com relação à autonomia que terá a Polícia Federal, peça-chave na Lava Jato, com o vice no poder. Jucá não é o único peemedebista implicado na Lava Jato. Há Renan Calheiros, Edison Lobão e Eduardo Cunha, apenas para citar alguns caciques do partido. Trata-se de um tema sensível. Temer precisa dar um sinal claro, inequívoco, capaz de tranquilizar a opinião pública. Por exemplo, a manutenção na direção-geral da PF do delegado Leandro Daiello. Há cinco anos à frente da instituição, ele acompanha a Lava Jato desde o início. Seria um excelente recado. O vice-presidente será cobrado pela sociedade a respeito da justa demanda de moralidade nos negócios públicos. E não bastará declaração formal em apoio à Lava Jato. Precisará fazer bem mais, com ações concretas que garantam que a PF continuará com liberdade operacional.
A PF goza hoje de maior independência. É indiscutível. Mas é preciso avançar na independência da instituição. Conceder à PF, por exemplo, a iniciativa da proposta do seu próprio orçamento, dentro dos limites da lei orçamentária, seria um passo importante. Pode-se falar de independência de uma instituição que precisa de autorização do Ministério da Justiça para uma viagem de mais de dez policiais? O atual efetivo da PF é quase o mesmo de 15 anos atrás. Pode?
Sem autonomia efetiva, bastam poucos atos dissimulados, como costuma acontecer, para que a Operação Lava Jato e tantas outras investigações sejam neutralizadas por completo. Trocas de comando, mudanças de lotação interna das autoridades policiais e do efetivo, corte de investimento, corte do orçamento, cargos vagos sem abertura de concursos públicos, sucateamento de PF, engavetamento de projetos, cobranças de estatísticas incompatíveis com os meios e efetivo policial são algemas ocultas que tolhem o trabalho da PF. Por isso, importa, e muito, a aprovação da PEC 412/09. A proposta de emenda constitucional não diminui os necessários controles sobre o trabalho da PF. O Ministério Público continua exercendo o controle externo da atividade policial e a Justiça Federal continua exercendo o controle da legalidade dos atos da Polícia Federal.
Reforçar as instituições da República, sua independência e transparência, é o melhor caminho de defesa da democracia. É isso que se espera de Michel Temer.
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