A recusa do Equador em cumprir com suas obrigações contratuais junto ao BNDES traz novamente à discussão a questão contratual e sua validade. Estaremos diante da morte dos contratos ou apenas nos deparando com a falta da boa-fé e dos valores sociais que devem norteá-los?

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Ao decidir não cumprir o contrato firmado com o BNDES, o Equador lança sobre os contratos a sombra da insegurança jurídica que sempre causou receio na contratação com os países em desenvolvimento.

Os contratos, que iniciaram sua história verbalmente, hoje ainda que válidos na maior parte das legislações nessa forma, foram substituídos por termos escritos, aos quais se atribui a possibilidade de garantir às partes o respaldo jurídico necessário a sua aplicação, de forma direta ou forçada. Admitir o descumprimento dos contratos por interesses unilaterais é admitir a morte dos contratos.

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O interesse que aproxima as partes em uma relação contratual, sejam elas governos ou instituições privadas, e as cláusulas escolhidas em um contrato não podem ser superiores à boa-fé e aos valores sociais. Os valores do contrato são muito superiores e vão além de promessas e direitos, para alcançar o campo da negociação justa e daquilo que as partes legitimamente desejavam.

As conseqüências e as promessas feitas pelas partes e suas vontades iniciais devem sempre ser preservadas, sendo superiores a deslizes de redação, de forma que eventuais cláusulas confusas, erros ou omissões jamais possam servir de desculpa para que as partes se furtem a cumprir o acordado.

Hoje é aceita, na maior parte das legislações, a possibilidade de alterações contratuais e revisões são até desejadas, desde que preservem o principal dos contratos: a vontade que os motivou. O que não se admite é o uso de subterfúgios como os que o Equador utiliza para fugir de suas obrigações.

O desejo inicial do Equador era obter a construção de uma hidrelétrica e para isso era necessário obter um financiamento. O objetivo de financiar projetos para desenvolvimento imbuía o espírito do outro contratante, o BNDES.

As partes tiveram seus objetivos realizados, ambos os desejos foram satisfeitos: o financiamento foi concedido, a hidrelétrica foi construída e, em um ato de total desrespeito, após obter o cumprimento das obrigações da outra parte, o Equador, lançando mão de um argumento de uma suposta ilegalidade contratual, desrespeita o acordo para não cumprir com sua parte nas obrigações.

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Toda vez que a vontade contratual é desrespeitada, os olhos dos potenciais contratantes e investidores internacionais se voltam para os países em desenvolvimento com desconfiança e apreensão. Novos negócios se perdem em virtude da fragilidade jurídica demonstrada, desanimadora para intercâmbios comerciais e investimentos que requerem seriedade.

O Equador, para não cumprir com o contrato, solicitou arbitragem junto a Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional, que irá julgar e determinar quem está com a razão neste caso.

O que se espera é que a Corte Arbitral, que pauta suas decisões normalmente pela boa-fé, pela ética, pela colaboração leal e pelo dever de cooperar das partes, seja capaz de corrigir os rumos do referido contrato. Ao solucionar o problema criado pelo Equador, por meio da determinação de cumprimento do contrato, a Corte estará, mais que ajustando um acordo quebrado, demonstrando que, ainda que de forma imposta, os contratos são marcos de segurança e permanecem vivos, válidos e servem como elemento de prova da vontade das partes que lhes deu origem e que, acasos ou mudanças em políticas governamentais ou desejos unilaterais não são capazes de condená-los a um papel de irrelevância.

Adriana Gavazzoni, mestre em Direito Econômico e Social, é professora de Direito Internacional e Comercial da Universidade Positivo e autora de Renegociação e Adaptação do Contrato Internacional.