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Até completar 14 anos, o adolescente Edmílson, hoje consagrado volante do Barcelona e pentacampeão brasileiro, trabalhava na roça. Uma vida dura na Vila São Sebastião, bairro pobre de Taquaritinga, cidade do interior de São Paulo, não feriu sua alma com a garra da revolta. Ao contrário, o menino talentoso, nas peladas com os amigos e nos estádios daqui e da velha Europa, foi mordido pelo impulso da solidariedade.

Para dar um futuro melhor para as crianças da região que, como ele, continuam queimando a infância nas lavouras do município, Edmílson acaba de lançar os alicerces da Fundação Edmílson Semeando Sonhos. E que alicerces, caro leitor! Acompanhado do prefeito Paulo Delgado, um entusiasta da iniciativa, visitei a entidade. Num terreno de 12.954 metros doado pela Prefeitura de Taquaritinga, foi erguido um complexo que abriga escola de esportes, quadras polidesportivas, bloco industrial, biblioteca, consultório odontológico, salas de cursos de português e inglês, espaço para cursos profissionalizantes e culturais, salas de reforço escolar e um magnífico anfiteatro.

"Esse projeto eu impulsiono com meu coração", disse o tímido Edmílson, que há anos trabalha para tirar as crianças da rua. "Muitas crianças em nosso país não têm essa chance, pois a infância tem que ser deixada de lado, dando lugar ao trabalho", lamenta o atleta. Mas sua queixa não ficou num lamento estéril. Ele teve a generosidade de plantar uma semente efetiva de solidariedade. Um belo exemplo. Uma boa notícia.

Da Fundação Edmílson Semeando Sonhos, já com a idéia de escrever este artigo, fui visitar a unidade de Taquaritinga do Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (Casa), antiga Febem. Outra boa notícia. A unidade alberga 40 adolescentes. Percorri todas as instalações e conversei com 29 internos. Tratei, sobretudo, de sentir o clima. Impressionou-me o empenho na recuperação dos menores. Os funcionários vestiram a camisa da recuperação. E os menores tinham brilho nos olhos e não o olhar opaco da revolta. Está em andamento, sem estardalhaço ou campanhas publicitárias milionárias, um mutirão de recuperação do menor infrator.

Terminei o dia na Comunidade Terapêutica Horto de Deus, entidade de referência na recuperação de dependentes químicos. Já escrevi, mais de uma vez, sobre essa instituição exemplar. Funciona num pequeno sítio, sem muros e sem grades. Os internos estão lá voluntariamente. Aliás, o desejo de deixar as drogas é um pré-requisito para ingressar na entidade. As internações compulsórias, em clínicas caras e sofisticadas, freqüentemente acabam na amargura da recaída. Falta o essencial: querer. Os pavilhões são simples, limpos e arejados. Sente-se no ar uma alegria que contrasta com a história pregressa dos seus moradores. Lá, depois de terem descido todos os degraus da miséria material e moral, reencontram a chispa, a esperança. Vida saudável, laborterapia, disciplina, resgate dos valores e terapia individual e de grupo compõem a receita da instituição.

Não se faz jornalismo, especialmente matéria de opinião, fechado entre as quatro paredes de uma redação ou circunscrito ao rarefeito ambiente de um laboratório acadêmico. É preciso ver, ouvir, apurar, sentir, refletir e, só então, escrever. Nada supera o realismo da velha e boa reportagem. Com esse espírito, movido pelo dever de obter informação verdadeira, fui, há alguns anos, atrás de literatura especializada, de fontes confiáveis e, sobretudo, de experiências bem-sucedidas na prevenção e recuperação de dependentes. Foi assim, caro leitor, que conheci o Horto de Deus (www.hortodedeus.org.br).

Terminei a maratona de visitas no aeroporto de São José do Rio Preto. Lá, desabei no Brasil oficial. Meu vôo atrasou quase 4 horas. Nenhuma informação. Nenhum pedido de desculpas. Que bom seria, caro leitor, se algumas de nossas autoridades descessem de seus pedestais e visitassem os homens de bem que teimam em construir o Brasil real.

A todos, um feliz 2007!

Carlos Alberto Di Franco é diretor do Master em Jornalismo, professor de Ética, doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra e diretor da Di Franco – Consultoria em Estratégia de Mídia. difranco@ceu.org.br

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