O desejo antigo de fomentar a cabotagem no Brasil tornou-se uma realidade com a aprovação da Lei 14.301/2022. Trata-se da norma que institui o estímulo ao transporte por cabotagem, conhecido como “BR do Mar” e permite a navegação entre portos ou pontos da mesma costa de um único país.
Em essência, o projeto de lei, apresentado em agosto de 2020 e sancionado em janeiro de 2022, focou em quatro eixos temáticos importantes: frota, indústria naval, custos e porto. A facilitação da entrada de embarcações estrangeiras no Brasil para a realização do transporte de cabotagem, que até então ocorria de forma restrita às embarcações brasileiras, é um aspecto relevante trazido pelo Programa de Estímulo ao Transporte por Cabotagem, no contexto da matriz de transporte no país.
O Brasil, naturalmente, tem vocação para a multimodalidade, e a BR do Mar pode representar um passo concreto na direção dos modelos de plataformas logísticas integradas
A extensão continental do território brasileiro sempre desafiou a matriz de transporte no país. A predominância do modal rodoviário no Brasil, conforme dados da Fundação Dom Cabral, pode chegar a 75% frente aos demais modais (9,4% do modal marítimo; 5,8% do modal aéreo; 5,4% do modal ferroviário; 3% da cabotagem e apenas 0,7% no sistema hidroviário).
Quanto ao eixo frota, coloca-se destaque para a viabilidade de afretamento de embarcação estrangeira a casco nu para operações por cabotagem sem a necessidade de lastro em embarcações próprias. Neste formato, o afretador assume a responsabilidade de gestão náutica e comercial, sendo que o navio será registrado em bandeira brasileira. Soma-se a isso a possibilidade de as empresas brasileiras de navegação afretarem embarcações a tempo: para substituir embarcações que estiverem em reparo ou construção; para atender operações que ainda não existam; e para cumprir exclusivamente contratos de longo prazo. Neste sentido, além de estimular o uso da cabotagem, o programa BR do Mar se propõe a aumentar a frota nacional e equilibrar a matriz de transportes. Outro ponto importante é a possibilidade de empresas estrangeiras utilizarem os recursos do Fundo da Marinha Mercante para financiarem a docagem de embarcações em estaleiros brasileiros.
Por outro lado, alguns trechos relevantes do projeto foram vetados e ainda estão sob a expectativa do mercado para serem retomados pelo Congresso, como a recriação do Reporto – regime tributário específico de incentivo à modernização e ampliação da estrutura portuária – e a redução das alíquotas do Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante (AFRMM), em que o texto do Congresso previa a diminuição de 25% para 8% do porcentual para a navegação de longo curso, e de 10% para 8% para cabotagem. Todos os vetos foram sustentados nos argumentos de renúncia de receitas e consequente impacto orçamentário e financeiro no Estado.
Até a chegada da BR do Mar, o Ministério da Infraestrutura demonstrou mais acertos do que desacertos. Na perspectiva da pasta, o programa pode significar um aumento de 40% nas embarcações que trafegam pela costa brasileira. O Brasil, naturalmente, tem vocação para a multimodalidade, e a BR do Mar pode representar um passo concreto na direção dos modelos de plataformas logísticas integradas, como forma de garantir eficiência à nossa matriz de transporte. Quem sabe seja um aceno para esta perspectiva!
Carmem Grasiele da Silva é advogada especialista em comércio internacional e autora de “Plataformas logísticas integradas nos Estados Unidos, China e Brasil: Impacto no Comércio Exterior”.
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