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Opinião do dia 1

Brasil e EUA: parceria energética futura?

Após seis anos de posicionamento temerário na condução de sua política externa, onde se colhem desgastes sucessivos desde 2003, o governo Bush decidiu, após a derrota do Partido Republicano nas eleições de novembro de 2006, atenuá-la, de modo que lhe possibilite reiterar a relação diplomática com parceiros tradicionais, como diversos países da América do Sul, por exemplo.

Nesse sentido, o Brasil substitui temporariamente a Venezuela na formulação geopolítica do Hemisfério por parte do Departamento de Estado, em razão da ausência de divergências de monta e da importância crescente do etanol como fonte energética, dada a sua característica de renovamento.

Em sendo os maiores consumidores de energia do globo, os Estados Unidos suprem tradicionalmente sua carência na área por meio da diversificação permanente de países fornecedores de petróleo e gás, de sorte que eventuais descontinuidades nunca interrompam, de maneira significativa, o andamento cotidiano de sua economia.

Isso permite ao país voltar-se até mesmo contra aliados como, por exemplo, no período da Primeira Guerra do Golfo, no início dos anos 1990, quando o Iraque foi o alvo. Com o desmantelamento desenfreado da União Soviética, os Estados Unidos puderam finalmente ingressar no mercado cáspio, com o objetivo de explorar jazidas de gás e, posteriormente, de petróleo. Assim, a economia estadunidense não sofre os mesmos percalços de outros países industrializados diante de eventuais choques de petróleo, como os desencadeados em 1973 e 1979.

Por conseguinte, diante do presente estado do Oriente Médio, fervilhante política e culturalmente; da política externa da Rússia, sôfrega em recompor a sua influência político-econômica no antigo território soviético; e do desmesurado crescimento da China, ávida por matérias-primas, os formuladores norte-americanos subscrevem a necessidade de ampliar a base energética do país, de preferência por meio do emprego maciço de fontes renováveis.

De todos os produtos utilizados no fabrico de combustível renovável, a cana-de-açúcar tem, em princípio, o melhor rendimento. Não obstante uma centena de países cultivá-la, uma dezena deles responde por cerca de 4/5 do plantio mundial, com destaque para o Brasil, seguido da Índia e da China – Estados Unidos e Argentina figuram no grupo principal, porém atrás de Cuba.

Dos três primeiros, o Brasil é o único capaz de empregar em torno da metade da produção para o desenvolvimento do etanol e, ao mesmo tempo, ainda dispor de vastas extensões de terras cultiváveis. Além do mais, o país desenvolve tecnologia própria desde o início da segunda metade da década de 1970, em decorrência do Primeiro Choque do Petróleo.

Posta a decisão de tornar-se um país agroexportador, perfil delineado nos anos 90 quando da impossibilidade de a indústria local enfrentar a estrangeira sem medidas temporárias de proteção ou de estímulo, o Brasil desempenha-se bem, de forma que a articulação em torno do estabelecimento do G-20, em agosto de 2003, seria o reconhecimento conseqüente de tal processo.

Diante da real possibilidade de não haver mais recuos significativos no preço do petróleo nos próximos anos, o etanol torna-se a melhor escolha para ser conjugado a ele, visto que seu papel será o de complemento ao mercado de combustíveis fósseis.

Responsável atualmente por metade da produção mundial, o Brasil poderia, em menos de duas décadas, exercer papel correspondente ao atual da Arábia Saudita na área petrolífera, ao subscrever cerca de 10% da demanda global, e influenciar, por meio de parcerias tecnológicas e investimentos externos diretos (IED), a implementação do setor em países como Haiti e Cuba.

No entanto, para viabilizar o papel de maior fornecedor mundial, tendo em vista naturalmente os Estados Unidos como os primeiros compradores, o país teria de investir na ampliação da infra-estrutura, em especial dutos, ferrovias e portos, sem os quais o Brasil, dentre outros motivos, continuará a ser sempre o país do futuro, como afirmou certa vez o general De Gaulle.

Virgílio Arraes é professor de Relações Internacionais da UnB.

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