Os últimos dados divulgados pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que apontam a ocorrência de mais de 61 mil homicídios no Brasil em 2016, evidenciam o colapso do modelo de segurança pública e a perda de controle do Estado em relação ao enfrentamento e contenção da violência urbana no país.
O estado de guerra permanente que assola o cotidiano da sociedade brasileira representa, independentemente da condição econômica e origem social de cada brasileiro, o maior desafio à crença coletiva nos valores democráticos, defesa e promoção dos direitos humanos.
A expansão de políticas e ações criminalizadoras é ineficaz porque não resolve a essência do problema
Contudo, a propensão de muitos brasileiros a ligar as causas da violência – que contabilizam milhares de mortes, sequestros, roubos, feminicídios etc. – à ausência de leis penais mais duras ou à própria defesa dos direitos humanos constitui uma falsa e ingênua maneira de pensar e resolver o problema. Experiências históricas de sociedades que acreditaram em regimes políticos autoritários ou em salvadores da pátria preconizam a falácia do endurecimento da pena e o encerramento em massa, e resultaram na escolha do caminho para o pior.
Afinal de contas, se sabemos, por experiência própria, que a violência gera violência, que homicídios geram homicídios e que as prisões tornam as pessoas piores, então não seria o caso de repensar valores, modelos mentais e iniciativas governamentais diferentes das que, até o momento, mostraram-se absolutamente incapazes de conter o crime e garantir a paz urbana? A expansão de políticas e ações criminalizadoras é ineficaz porque não resolve a essência do problema.
Outro lado: A necessária compreensão do fracasso (artigo de Fabricio Rebelo, pesquisador em segurança pública)
A reversão do quadro endêmico de violência e de homicídios que atormenta a vida dos brasileiros exige a criação de políticas públicas em duas frentes: repensar o modelo de combate ao uso e tráfico de drogas; e buscar soluções estatais para superar o estado de pobreza e de abandono das periferias urbanas, de onde provém o maior número de autores e vítimas fatais de violência. As cifras anunciadas provam este pressuposto: 81,8% dos homicídios envolvem pessoas jovens. Por isso, não basta simplesmente criminalizar os jovens, mas providenciar mecanismos educacionais, lazer e trabalho, em vez de assassiná-los.
Uma sociedade democrática, sensível à convivência de valores plurais e moralmente capaz de se indignar frente às injustiças sociais e às histerias coletivas que legitimam o derramamento de sangue e ações policiais violentas põe-se ao desafio de ler, conhecer e refletir melhor sobre a importância dos direitos humanos no processo de contenção da violência urbana. Afinal de contas, sem direito ao trabalho, à moradia, à saúde, à educação de qualidade, a crescer e envelhecer com dignidade, é quase impossível reduzir o estado de guerra, de mortes e de insegurança social.
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