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Nas últimas semanas, foi noticiado em grande parte da imprensa a revisão dos acordos do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) com a Petrobras. A saber, esses acordos, também chamados de Termos de Compromisso de Cessação (TCCs), foram firmados há cinco anos, durante o governo anterior, no período da presidência de Roberto Castello Branco na estatal e de Alexandre Barreto no órgão de defesa da concorrência.
Esses TCCs do CADE com a Petrobras foram resultado de processos que acusavam a petroleira de monopólio e que foram arquivados em troca desses acordos, mas que já vinham a reboque de um processo mais amplo de desinvestimentos de ativos por parte da Companhia, iniciado em 2015 e que ganhara fôlego até meados de 2021.
O custo para o Brasil desse tipo de revisão é amplificar a sinalização aos investidores de todo o mundo de que aqui não se cumprem acordos
Os acordos abrangiam dois dos mercados amplamente dominados pela estatal e estabeleciam algumas medidas a serem seguidas visando maior participação de atores privados tanto no mercado de refino quanto no de gás natural. O primeiro acordo previa a venda de metade de seu parque de refino, que compreendia as refinarias Abreu e Lima, em Pernambuco; Unidade de Industrialização de Xisto e Presidente Getúlio Vargas, ambas no Paraná; Landulpho Alves, na Bahia; Gabriel Passos, em Minas Gerais; Alberto Pasqualini, no Rio Grande do Sul; Isaac Sabbá, no Amazonas; e, por fim, a Refinaria de Lubrificantes e Derivados de Petróleo do Nordeste, localizada no Ceará. O prazo para o desinvestimento das refinarias deveria ser concluído até o dia 31 de dezembro de 2021; no entanto, até o início de 2023, ano em que um novo governo com posições contrárias aos desinvestimentos da estatal assumiu, apenas três foram efetivamente desinvestidas.
O segundo acordo versava sobre a venda de ativos na área de gás natural com o objetivo de dar fim à verticalização no mercado. O que se propôs foi a venda dos três maiores gasodutos brasileiros de transporte (TAG, NTS e TBG), além da participação pertencente à petroleira na Gaspetro, holding que detinha participação em diversas distribuidoras de gás nos estados. Pode-se afirmar que, ao fim e ao cabo, este segundo acordo foi, na medida do possível, mais bem-sucedido. Apenas um dos ativos, o gasoduto TBG (Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil), que faz a ligação entre o mercado boliviano e o brasileiro, não foi desinvestido.
Hoje, com as recentes notícias veiculadas que dão conta da revisão desses acordos, podemos compreender os riscos embutidos nas tomadas de decisão de investimentos no Brasil com base na insegurança jurídica explícita. Um órgão da importância do CADE, que tem como missão institucional “zelar pela livre concorrência no mercado, não só por investigar e decidir, em última instância, sobre a matéria concorrencial, como também fomentar e disseminar a cultura da livre concorrência”, não pode, sob nenhuma hipótese, tomar decisões conflitantes com sua própria essência e natureza de existir, apenas ao gosto e preferência do governo de plantão, como essa em relação à Petrobras.
O custo para o Brasil desse tipo de revisão, de contrassenso, é amplificar a sinalização aos investidores de todo o mundo de que aqui não se cumprem acordos, que o Estado guiará as decisões de mercado com base nos caprichos do governo de ocasião e que os recursos aportados com base em análises de viabilidade econômica jamais compreenderão, entre suas taxas de retorno, a influência política de burocratas palacianos. Qual a certeza e a segurança em aportar bilhões de reais em uma planta de refino, prevendo a abertura de mercado e maior concorrência entre os entrantes, se algum tempo depois, com um gesto tão singelo quanto uma canetada, redesenha-se novamente toda a estrutura de mercado e voltamos à estaca zero da abertura ora almejada?
Sendo bem honesto, não creio que algum grande fundo soberano ou de private equity, em sã consciência e sob uma perspectiva pragmática de investimento, aportaria seus recursos em um ambiente tão hostil como este. Alguns dizem que a famosa frase “no Brasil, até o passado é incerto” foi proferida pela primeira vez pelo ex-ministro da Fazenda Pedro Malan; outros afirmam que o primeiro a citá-la foi o ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola, mas uma coisa que todos concordam é a sua precisão em definir o Brasil.
Wesley Reis é economista.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos