A pandemia que abala o mundo demonstrou claramente pelo menos uma coisa: a irracionalidade das posições político-ideológicas no combate ao coronavírus. Isso vale tanto para a Organização Mundial da Saúde quanto para os governos, todos errando mais que acertando. Não, não há método científico nessas decisões, embora a “ciência” seja invocada constantemente por todas as posições. Prevalece a cegueira.
De um lado, temos os governantes negacionistas, que confundem os cidadãos com seu péssimo exemplo, induzindo-os a comportamentos de risco: recusa ao uso de máscaras, aglomerações nas ruas, promoção de festas madrugada adentro etc. Frequentemente, tais governantes proclamam a “violação das liberdades individuais”, como se fossem liberais de fato.
De outro lado temos aqueles que defendem a paralisia geral, agindo até mesmo com violência contra transeuntes, como ocorreu em alguns municípios brasileiros onde prefeitos calçaram o coturno de tiranetes. Estes, incluída parte da mídia, parecem comemorar as mortes como se estivessem num campeonato, exibindo índices alarmantes dia e noite, além de imagens de valas abertas e caixões. Houve quem previsse pelo menos um milhão de mortes no Brasil.
A conduta de governos e órgãos internacionais ligados à saúde, como a OMS, não tem gerado mais que desorientações. É um constante jogo de avanço e recuo. Primeiro não se devia usar máscara, que depois se tornou obrigatória; remédios foram apresentados como eficazes e depois rejeitados por ineficazes; bares e restaurantes foram reabertos e, com a progressão da contaminação, fechados de novo. Isso se revelou desastroso para os cidadãos e para o mercado, cada vez mais inseguros diante desse vaivém.
Nem catastrofismo nem negacionismo, portanto, ambos distantes da ciência - aquela praticada nos laboratórios de universidades e centros de pesquisa dos principais países, empenhados na descoberta de uma vacina. Se há solução, é de lá que virá, por temporária que seja.
Diante do desconhecido, não devemos confiar em governantes e suas ideologias, mas no trabalho dos cientistas que dedicam dias e noites à pesquisa. Negacionistas e catastrofistas não passam de charlatães.
Isso não implica, porém, assumir uma atitude cientificista diante dos problemas que afligem a humanidade. Como alertou a filósofa Susan Haack, não devemos “negar ou denegrir a legitimidade ou o valor de outros tipos de investigação além da científica, ou o valor de atividades humanas além daquele tipo de investigação, como a poesia e a arte”.
Mas reconheçamos o fato: nem catastrofistas nem negacionistas produzem vacinas.
Orlando Tambosi é professor aposentado da UFSC.
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