A palhaçada mais eloquente na nova aventura de Hugo Chávez foi a presença ao seu lado do futebolista argentino, Diego Maradona, ao anunciar o novo rompimento das relações diplomáticas com a Colômbia.
El pibe topa qualquer papel, depende do cachê que recebe: veste a odiosa camisa canarinha para vender o nosso guaraná, posa sorridente ao lado do arquirrival Pelé para um sofisticadíssimo anúncio da Louis Vuitton e, agora, posta-se ao lado do coronel de fancaria, Hugo Chávez, para apoiá-lo em nova crise cujo pivô é o de sempre: o grupo narcoterrorista colombiano, Farc.
Figura indispensável em qualquer show populista latino-americano, Maradona representa o futebol a serviço do caudilhismo, títere dos mussolinis do século 21, o lado burlesco da seriedade argentina, antípoda do romântico, sutil e perplexo Ricardo Darin. As novas gerações não conheceram o genial mexicano Cantinflas, falastrão, parlapatão, maltrapilho que, enquanto segurava as calças, não parava de falar e não dizia coisa alguma. Miúdo, subserviente, coberto de joias, Maradona como porta-voz de Chávez é a imagem de um continente que insiste em perder todos os bondes da história.
Neste início das comemorações do bicentenário da emancipação da colônias espanholas na América do Sul, a dupla Maradona-Chávez compõe uma cruel caricatura de libertadores como Francisco Miranda, Simon Bolívar, San Martin e O Higgins. Uma semana depois do show da exumação dos restos de Bolívar para comprovar que foi assassinado e não foi vítima de problemas pulmonares como comprovaram as autópsias, Chávez aciona novamente o seu inesgotável arsenal de maluquices para esconder o desastre socioeconômico no qual enfiou seu país.
O colombiano Álvaro Uribe é um caudilho sem uniforme, mas entregará em 7 de agosto a faixa presidencial ao sucessor eleito por esmagadora maioria, Juan Manoel Santos. Mesmo que seja vítima da mesma paranoia do vizinho-adversário, não faz sentido acusá-lo de armar um novo incidente já que Santos comprometeu-se formalmente em desativar os contenciosos entre os dois países.
Foi inútil a furiosa reação de Caracas à exibição de fotos e vídeos promovida pelos colombianos na OEA para comprovar a presença de milicianos das Farc no lado venezuelano da fronteira. Sobretudo porque essa presença foi confirmada pelos generais de Chávez.
A diplomacia brasileira comeu mosca mais uma vez e no seu próprio quintal: errou quando deu corda às estripulias autoritárias de Chávez, errou em Honduras ao dar asilo a um presidente que não respeitou as regras constitucionais, errou no caso da greve de fome dos dissidentes cubanos e erra agora ao concentrar-se quase que exclusivamente em evitar a mediação americana esquecido de que deveria antecipar-se à exacerbação do confronto.
A questão das FARC não é remota. Temos fronteiras muito permeáveis com a Colômbia, Venezuela, periodicamente aparecem denúncias sobre a presença de milicianos na Região Amazônica e representantes políticos do grupo em nossos grandes centros. Por infelicidade o nome das FARC entrou nos palanques eleitorais e agora, depois da exibição circense de Chávez, dificilmente sairá.
Apesar das eleições presidenciais de outubro, cabe aos diplomatas cuidar dos nossos interesses permanentes. Maradona é um ídolo caído, mera curiosidade midiática, mas Hugo Chávez é um delirante sem saídas, disposto a tudo.
Alberto Dines é jornalista