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A facilidade para ter acesso ao abortos com alegação de ter sido vítima de violência sexual pode dar brechas para a realização da prática em gestações de relações consentidas.
Imagem ilustrativa.| Foto: Andre Borges/Agência Brasília

No ano de 2016, em uma ação de grande repercussão midiática, nossa Suprema Corte decidiu que uma prática de mais de três séculos de existência deveria ser proibida porque impunha sofrimento e maus tratos aos animais. Muito embora já fizesse parte da cultura de inúmeras cidades brasileiras, a vaquejada foi considerada inconstitucional porque o ato de dois vaqueiros montados a cavalo tentarem derrubar um boi puxando-o pelo rabo infligia intensas dores no animal, uma tortura inaceitável.

Hoje, 26 de junho, Dia Internacional de Combate à Tortura, o STF está, mais uma vez, às voltas com o tema. Agora, entretanto, não sob o prisma dos animais, mas sim, de “monstros” – segundo afirmado em cadeia nacional de televisão, bebês frutos de um estupro são monstros.

O Brasil é o primeiro país no mundo em que o poder público chancela um procedimento de tortura para crianças

Para aqueles que seguem essa lógica, a ADPF 1141 requer seja realizado o assassinato de monstros dentro do ventre de suas mães. Depois de 22 semanas de gestação, esses indivíduos assustadores já podem sobreviver fora do útero de suas mães e a ação judicial indica que possibilitar a vida a estes seres é algo inadmissível, devendo-se, pois, injetar um ácido que os queima lentamente por dentro, com várias dosagens bem superiores à utilizada na eutanásia de animais e, logicamente, sem anestesia – afinal de contas – são meros monstros.

Aliás, por terem natureza monstruosa, essas pequeninas criaturas não têm direito algum e aqueles que tentarem criar um projeto de lei tentando salvaguardá-las dessa atrocidade serão ridicularizados e rotulados pela grande mídia com jargões rasos e mentiras totalmente infundadas.

De fato, há uma parcela da sociedade que insiste em afirmar que as vítimas dessa cruel tortura não seriam monstros e que a dignidade é ínsita a cada uma delas, persistindo em dizer que são seres indefesos, cujo estado de extrema vulnerabilidade demanda maior zelo com suas vidas, futuro de nossa sociedade. Aduzem que todo mal que existe hoje advém dessa insensibilidade de não se respeitar a vida destes hipervulneráveis.

Entretanto, ao fim e ao cabo, a sociedade segue dividida: os que acreditam se tratar de meros monstros esperam ansiosamente que a Suprema Corte confirme a tutela cautelar concedida na ADPF 1141 para que se continue a queimar os monstrengos de forma lenta e dolorosa. Do outro lado, aquela outra parte da sociedade segue atônita. Pergunta-se sobre quem irá se responsabilizar perante cada ser humano que vier a ser quimicamente queimado vivo e, perplexos, aguardam que o STF se posicione imediatamente contra essa monstruosa tortura, com o mesmo ímpeto com que defendeu os animais dos maus tratos.

Enquanto isso não acontece, com a tutela concedida, o Brasil é o primeiro país no mundo, em que o poder público chancela um procedimento de tortura para crianças.

Danilo de Almeida Martins é jurista.

Conteúdo editado por:Jocelaine Santos
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