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Como acertei tudo o que aconteceria na Argentina de Milei

Milei diz que Argentina é um “aliado estratégico” dos EUA e fala sobre relação com Trump e China
O presidente da Argentina, Javier Milei, durante a cúpula do G20 no Rio de Janeiro (Foto: EFE/André Coelho)

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Quando Milei assumiu a presidência na Argentina o que eu disse que aconteceria? Os posts estão todos nas minhas redes sociais, abertos: eu disse que o PIB iria desabar e miséria explodir. Depois, quando o PIB voltasse ao nível que estava antes da devastação, eles iam dizer que recuperaram a economia. É o que neoliberais sempre fizeram. É o que aconteceu.

O anúncio de que nesse trimestre a economia na Argentina de Milei cresceu 3,9% esconde que ela desabou 7,5% nos primeiros trimestres – se ela subiu 3,9% em cima de 92,5% do que era, na verdade só recuperou 3,6% do perdido. O saldo é a destruição de 3,5% da capacidade de gerar riqueza na Argentina só esse ano. Ao fim do ano, o saldo do PIB deve ser de menos quatro pontos.

Mesmo que o PIB argentino suba 5% no agregado de quatro anos e a inflação fique nesse nível altíssimo que está hoje, de cerca de 2,5% ao mês, teria valido a pena? A propaganda neoliberal dirá que sim. Mas isso na prática teria simplesmente gerado uma estagnação econômica de 4 anos

O pior é que toda essa suposta recuperação se deu com o crescimento da safra em comparação com o ano passado, de seca terrível. A indústria, ao contrário, foi devastada, o que desindustrializará ainda mais a Argentina e precarizará seus empregos. Quando o PIB voltar, será numa economia ainda mais primária.

Eles dizem que Milei previu essa queda do PIB na Argentina. Mas é claro. Essa técnica retórica tem nome em psicologia, se chama "duplo vínculo". O terapeuta prevê que no começo da terapia o cliente ainda vai piorar "porque está finalmente confrontando seus problemas". Se ele piora, o terapeuta acertou, se melhora, é um gênio. Assim o terapeuta ganha a confiança do cliente. Esse é o mecanismo que o neoliberalismo usa para fazer pessoas defenderem a piora de suas próprias condições de vida. A crença mística de que tudo tem que piorar antes de melhorar.

Mas mesmo que o PIB suba 5% no agregado de quatro anos e a inflação fique nesse nível altíssimo que está hoje, de cerca de 2,5% ao mês, teria valido a pena? A propaganda neoliberal dirá que sim. Mas isso na prática teria simplesmente gerado uma estagnação econômica de 4 anos, crescimento vegetativo, com um agravante, ninguém devolverá a uma geração inteira esses anos de desespero e humilhação, com mais da metade do povo argentino na faixa de pobreza: Milei mandou mais 11% da Argentina para lá em somente 3 meses. Mas esse é o melhor cenário.

Se o dólar subir, isso vai estrangular o acesso do país a moeda forte e colapsar os ganhos de combate a inflação. Então será perda total. É uma política frágil. Diante de tudo isso, o que mais espanta nos neoliberais que operam em enxames de contas fake operadas por cinco ou seis pessoas (eu não posso provar, mas tenho forte intuição de quem são) é que a retórica deles é cientificista, eles quererem ensinar "ciência econômica" para o interlocutor como se as doutrinas de economia política deles fossem ciência natural.

Enquanto isso, a China, a Índia, a Coreia, o Vietnã, Singapura e a Rússia prosperam praticando "atraso econômico", blindadas contra o dólar e sem depender de investimento externo, enquanto a "ciência econômica" neoliberal no Ocidente comandado pelo mercado financeiro desde Reagan e Thatcher continua o atolando na estagnação e entregando o futuro do planeta nas mãos da Ásia.

Gustavo Castañon é professor de Filosofia e Psicologia na Universidade Federal de Juiz de Fora.

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

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