Faltam apenas dois meses para as eleições do Parlamento Europeu e a grande dúvida é saber como a aliança dos populistas de extrema-direita se sairá. Sua estratégia é bem clara: em discurso em julho, Viktor Orban, primeiro-ministro da Hungria e destaque do movimento, declarou, beligerante, que “chegou a hora de as eleições europeias abordarem uma questão importante e comum ao continente: a imigração, e o futuro relacionado a ela. A direita está organizada e confiante. Acreditamos ser o futuro.”
Será que ele está certo? A convicção geral na Europa hoje é a de que o auge da direita radical já passou. Essa visão é baseada principalmente na ideia de que a “crise de refugiados” foi superada. Se a ascensão populista foi insuflada por um problema concreto em 2015, quando um milhão de refugiados e migrantes entraram no continente, tal problema hoje não existe mais.
É verdade que os números caíram: foram menos de 150 mil chegadas irregulares no ano passado, o que ainda fica acima, mas não muito, da média anterior a 2014, que era de 100 mil por ano. Essa análise leva à conclusão tranquilizadora – mas perigosa – de que os tremores que ainda atingem o cenário político local vão passar assim que a percepção pública se acomodar à realidade.
Talvez a ubiquidade dessa visão seja responsável pela inércia que atinge os principais partidos políticos, que parecem ter desistido de instaurar quaisquer iniciativas sérias para reformar as políticas de asilo e migração. As propostas que ainda surgem são irrelevantes (mais 10 mil guardas na fronteira da União Europeia), impraticáveis (“plataformas regionais de desembarque” na África) ou vazias (“centros de controle” dentro dos limites da UE). Nenhuma é levada adiante com muita convicção.
A história para rechaçar a narrativa populista deveria começar assim: não há invasão; a migração é controlável e deve ser contida
O que é insensato. Se os líderes mais populares, tanto de direita como de esquerda, estão esperando que a queda nas chegadas dos imigrantes impeça a insurgência da extrema-direita por si só, ficarão bem decepcionados em maio.
Isso porque, em grande parte, essa narrativa populista sobre a imigração é provada em números. A história que os líderes iliberais contam é simplista, emotiva e poderosa: o continente enfrenta uma invasão de bárbaros, e somente a direita será capaz de interrompê-la. O alto número de chegadas é prova de sua premissa; o baixo, da eficácia de suas medidas. Não importa que suas políticas cruéis sejam amplamente irrelevantes. As cercas de Orban na Hungria e a perseguição realizada pelo governo italiano com barcos de resgate têm uma grande visibilidade, mas o verdadeiro trabalho está sendo feito na Líbia e na Turquia e pelas condições cada vez mais deploráveis nas ilhas gregas – políticas e falhas pelas quais todos os líderes locais dividem a responsabilidade.
O ponto, entretanto, é o seguinte: os populistas propõem, executam e anunciam medidas consistentes com sua história. Os partidos grandes deveriam copiar o método.
Eles precisam, primeiro e acima de tudo, de uma história diferente; a narrativa populista da invasão migrante colou no auge da crise de refugiados. A realidade, porém, é que os eventos de 2015 foram excepcionais, consequência da implosão quase simultânea de dois países próximos – a Síria, que gerou cinco milhões de refugiados, e a Líbia, que abriu uma passagem até então fechada para a Europa. Os catastrofistas de imigração geralmente se concentram na África, mas mesmo em 2016, ano de pico das travessias pelo Mediterrâneo Central, somente 165 mil saíram do continente. É um número alto e insustentável, sim, mas não incontrolável – e certamente não se trata de invasão.
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A história para rechaçar a narrativa populista deveria começar assim: não há invasão; a migração é controlável e deve ser contida. Mas isso não basta; é essencial também gerenciar e reduzir os fluxos migratórios. Os populistas dizem que vão barrar todo mundo; os políticos de princípios devem anunciar que vão controlar as fronteiras de forma humana; que não vão vetar a todos, mas desencorajar aqueles que não tiverem justificativa ou necessidade de proteção, e mandar de volta os que chegarem nessas condições; que respeitarão os direitos humanos e a lei de refugiados; que receberão bem os perseguidos; que resgatarão quem estiver à deriva no mar; que trabalharão em conjunto e investirão nos países vizinhos (como a Turquia) para expandir o espaço em que os refugiados podem viver (e para onde possam retornar) com dignidade; que oferecerão aos migrantes a oportunidade de se estabelecer e trabalhar regularmente, em proporção com as necessidades e a capacidade de cada nação.
Acontece que não podem só dizer essas coisas; têm de mostrar que vão cumpri-las. Precisam de políticas que reforcem sua história. Grande parte dos valores “europeus” que estão sendo apregoados estão no centro dessa narrativa. São importantes, são populares, são o que distingue o democrata do demagogo – e estão, em grande parte, explicitamente ausentes das práticas que vêm sendo empregadas para reduzir a pressão em suas fronteiras.
No frigir dos ovos, a questão crucial é a seguinte: como é que os governos devem fazer um controle fronteiriço eficaz, mas humano? A resposta sincera deve ser: com dificuldade, a um custo alto, mediante reformas administrativas significativas, incluindo mudanças legislativas.
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É complicado, sim, mas necessário. Os contornos mais amplos já estão bem claros. Uma coalizão de governos europeus de boa vontade deve ser formada para garantir um processamento rápido, mas justo, de todas as requisições de asilo nos centros de recepção dos portais de entrada e recusar aqueles que não têm base justificada para proteção, retornando-os a seus países de origem. Para isso, devem fechar acordos com essas nações que têm papel fundamental em seus interesses – e, quando possível, retornar os refugiados a países de trânsito que se dispuserem a recebê-los, mas somente se seus direitos forem respeitados integralmente ali, o que exige investimento e monitoramento. Por fim, devem distribuir os refugiados reconhecidos por esses centros para outros Estados membros participantes.
Os principais partidos e políticos europeus devem endossar um plano como esse imediatamente e já começar a definir os detalhes. É um trabalho imenso e difícil, mas custa menos – e é menos perigoso – do que não ter nenhum. Não fazer nada, ou tomar várias medidas ineficazes, não vai convencer os eleitores e certamente não vai reconquistar aqueles que foram seduzidos pelos populistas alarmistas. Os democratas podem vencê-los em maio, contando uma história melhor e executando políticas mais sólidas. Eles têm dois meses para provar que podem fazê-lo.
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