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Além de legitimar os assassinatos como instrumento da política, o ministro da Justiça do Brasil ainda insulta a República Italiana, colocando em dúvida a imparcialidade de sua magistratura

O filósofo George Santayana foi claro: "o moço que não chora é um selvagem; o velho que não ri é um tolo". Como já estou na segunda faixa etária, procuro rir das coisas e das situações para evitar ficar como aqueles velhos ranzinzas que reclamam de tudo. Na minha família, há mesmo uma história de um tio que ficava ouvindo o rádio e, quando o locutor lia o "reclame" que afirmava: "Melhoral é melhor e não faz mal!", ele resmungava: "Que não faz mal! Dá uma azia miserável." Devo confessar, porém, que está cada vez mais difícil rir, pois parece que estamos todos encenando um reality show baseado em um filme delicioso de John Cleese e dos Monty Python chamado Como Irritar as Pessoas (How to Irritate People) .

Algumas pessoas e situações são sinal iminente e alarmante de irritação à vista. Nem falo do telemarketing que liga a qualquer momento (noite inclusive) para oferecer uma conta bancária ou uma assinatura de tevê a cabo. Quando se ouve o inefável: "Com quem eu falo?", é hora de desligar e tirar o telefone da tomada. Caso contrário, não diga que não avisei.

Aeroportos são outra fonte segura de irritação múltipla. As empresas aéreas, muito zelosas com o peso da bagagem de mão, obrigam os que excedem os cinco quilos (ou sete, quando são tolerantes) a despachar a mala de mão ou transferir o conteúdo para a bagagem despachada. Ordens das "autoridades aeronáuticas". Mas então chega uma trupe de turistas finlandeses com mochilas colossais às costas e, como ninguém fala finlandês, não se ousa exigir que despachem a tralha; e assim, você, que se submeteu aos rigores da balança, se senta ao lado de um dos finlandeses, espremendo sua malinha de mão no compartimento de bagagem para fazer caber as barracas de acampamento, frigideiras e coisas assim. A tecnologia aeroportuária é outra que não falha: causa irritação na certa. O Aeroporto Afonso Pena tem apenas seis portões de embarque e não pode ser tão difícil programar onde irão se posicionar os aviões. Engano meu, deve ser tarefa complexíssima, pois com frequência, "devido ao reposicionamento da aeronave, o seu embarque, quando autorizado, será realizado pelo portão...", situado infalivelmente a 50 metros de distância.

Meus pacientes leitores se lembram de uma procuração que uma amiga minha teve de fazer para representar a filha em um negócio e que continha quarenta e nove verbos diferentes que lhe davam "poderes amplos e irrestritos" para praticar quaisquer atos em nome da representada, inclusive junto a qualquer banco público ou privado. Pois é, o documento não ultrapassou a barreira de um advogado do Banco Itaú, que exigiu que a procuração dissesse expressamente que o procurador podia solicitar e retirar talões de cheque, registrar senhas... Pelo jeito, os poderes amplos gerais e irrestritos não incluíam atos dessa importância e complexidade.

O ministro Tarso Genro é outra fonte segura, pelo descaso com que trata a inteligência dos outros. Os dois boxeadores cubanos que pediram asilo no Brasil foram defenestrados por ele sem cerimônia pois, segundo ele, pediram para ser repatriados... Foram tratados como párias em Cuba e, meses depois, um deles fugiu para a Europa, o que demonstra que o ministro estava enganado quanto ao ardor de sua vontade de voltar à ilha. Agora, concedeu ao italiano Cesare Battisti, condenado na Itália por quatro assassinatos, status de "refugiado político", contrariando o parecer de seu próprio ministério. Para Tarso, havia dúvida de que Battisti havia sido julgado de modo isento na Itália... Ou seja, além de legitimar os assassinatos como instrumento da política, o ministro da Justiça do Brasil ainda insulta a República Italiana, colocando em dúvida a imparcialidade de sua magistratura. Aos amigos, tudo; aos indiferentes, a lei; aos inimigos, os rigores da lei.

PS: Carlos Alberto Faraco, com a elegância costumeira, corrige erro que cometi no artigo da semana passada em relação à homologação do Acordo Ortográfico em Portugal. Agradeço a Faraco a distinção da leitura e a restauração da exatidão dos fatos, embora continue a duvidar da oportunidade e da prioridade do Acordo.

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