Por ocasião do último pleito eleitoral, alguns analistas previam que, assim como ocorreu em alguns países de democracia avançada, a internet poderia tornar-se a grande novidade nas eleições. Afirmavam tais observadores que essa influência poderia ser reforçada pelas restrições impostas pela legislação à realização das campanhas eleitorais. Devido a tais restrições, a internet previam tais analistas poderia tornar-se um dos meios mais utilizados (e quiçá mais eficazes) para organizar as campanhas e contornar alguns dos obstáculos interpostos à propaganda eleitoral pela legislação recente.
Tal fenômeno de fato ocorreu? A internet tornou-se uma das "estrelas" da última campanha eleitoral, conforme previam antes de seu início alguns analistas? Nas linhas abaixo, apresentamos algumas evidências que possibilitem uma resposta mais fundamentada a tais perguntas e, complementarmente, formulamos sugestões com vistas a corrigir alguns defeitos na legislação vigente sobre o uso da internet pelos candidatos, assim como melhorar os estatutos normativos que regulamentam o uso da internet em campanhas eleitorais no Brasil.
Temos assim que o estado da Região Sul que apresentou maior taxa de uso web sites pelos candidatos foi o Paraná (9,5%), seguido por Santa Catarina (7,9%) e pelo Rio Grande do Sul (2,7%). No tocante aos cargos disputados, a categoria que apresentou a maior taxa de construção de web sites foi a de governador (65,5%), seguida pelos candidatos ao Senado Federal (38,5%), deputados federais (7,3%) e, por fim, deputados estaduais (4,2%).
Já em relação ao uso que os candidatos paranaenses fizeram do e-mail para interagir com o eleitor, os dados de nossa pesquisa indicam o seguinte:
Do total de 814 candidatos, apenas 77 web sites foram efetivamente encontrados, o que dá um porcentual de 9,4%;
Desse total de 77 web sites, 49 apresentaram links para e-mails, ou os informaram de maneira clara, o que representa 63,63% do total;
Ainda assim, nem todos responderam aos e-mails enviados pedindo informações sobre as candidaturas. Dos 49 e-mails enviados, apenas recebemos resposta em 19 dos casos, o que representa um porcentual de 38,77%;
Em relação ao total de candidatos, o porcentual que apresentou e-mail para contato com o eleitor é de apenas 6,01%;
E o pior: os candidatos do estado do Paraná que responderam aos e-mails representam apenas 2,33% do universo populacional total.
Realmente, o "boom" virtual que vivenciamos recentemente não repercutiu na arena eleitoral no último pleito. Logo, a necessidade de que os candidatos percebam a importância de mais esse canal para a divulgação de candidaturas e suas propostas concretas, proporcionando mais um meio de acesso à informação democrática aos brasileiros, ainda não se concretizou no Brasil, especialmente no Paraná.
A nosso ver, três fatores podem servir com explicação para esse baixo grau de uso da internet pelos candidatos a vários postos eletivos no último pleito eleitoral da região Sul: (i) Falta de acesso dos parlamentares às ferramentas tecnológicas da internet; (ii) Subestimação pelos candidatos dessa ferramenta de campanha devido aos elevados índices de exclusão digital no Brasil; (iii) Ausência de incentivos e controles institucionais sobre o uso da internet pelos candidatos.
De todos esses motivos, devemos destacar esse último. Nesse sentido, podemos encerrar este artigo sugerindo algumas propostas de melhorias na legislação eleitoral, de molde a que se criem incentivos para o uso da internet pelos candidatos, facilitando assim a fiscalização dos políticos pelos cidadãos e pela opinião pública.
A legislação que regulamentou o uso da internet é muito "liberal" e não estimula o uso deste recurso pelos candidatos. Sendo assim, sugerimos as seguintes medidas para estimular tal uso, colocando nas mãos do eleitor, especialmente do eleitor mais informado, uma poderosa ferramenta de controle de seu representante:
1) Obrigatoriedade do candidato ou político no exercício do mandato de notificar os TREs sobre o uso dos web sites particulares e oficiais (i. e., terminados em .can) durante o período eleitoral e quando do registro das candidaturas, sob pena de sanção (multa ou, mesmo, impugnação da candidatura);
2) Os TREs poderiam manter em suas homepages uma listagem com todos os candidatos que possuem web sites;
3) O TSE poderia elaborar um folheto orientador de construção de web sites e de uso da internet em campanhas eleitorais pelos candidatos, nos moldes dos já elaborados pela União Parlamentar Internacional para a construção de web sites parlamentares;
4) Os web sites dos candidatos poderiam ficar disponíveis mesmo após o período eleitoral, a fim de que o eleitor possa cobrar as famosas "promessas" de campanha.
Essas são providências simples, mas que certamente contribuiriam para facilitar a fiscalização dos candidatos pelos eleitores e, indiretamente, para melhorar a qualidade de nossos políticos.
Letícia Carina Cruz é pesquisadora do Departamento de Ciência Sociais da UFPR e bolsista do programa UFPR/TN.
Sérgio Soares Braga é professor do Deciso/UFPR e coordenador do projeto "Internet e Política", desenvolvido na instituição.
Bolsonaro e mais 36 indiciados por suposto golpe de Estado: quais são os próximos passos do caso
Bolsonaro e aliados criticam indiciamento pela PF; esquerda pede punição por “ataques à democracia”
A gestão pública, um pouco menos engessada
Projeto petista para criminalizar “fake news” é similar à Lei de Imprensa da ditadura