Desde o ano passado, quando foi sancionada a Lei dos Portos (12.815/2013) pelo governo federal, era visível que o processo não seria tão fácil quanto previa o governo. O primeiro bloco de concessões foi anunciado para acontecer ainda em 2013. Porém, até agora, nenhuma licitação saiu efetivamente do papel, e não deve sair tão cedo. Mesmo com a autorização do Tribunal de Contas da União (TCU) para a retomada dos processos, o governo ainda vai enfrentar uma longa jornada pela frente. Isso porque a avaliação feita pelos técnicos do TCU tem que passar pelo aval da ministra do Tribunal Ana Arraes e só depois será encaminhada para o plenário. Ou seja, a licitação continua sem data prevista.
Além da avaliação do TCU, ainda existe uma questão pouco comentada: as empresas portuárias com contratos de arrendamentos estabelecidos antes de 1993. O fato é que essas companhias estão se mobilizando para questionar na Justiça a retomada pela União das áreas concedidas e suspender os editais de licitação, prometendo uma verdadeira guerra judicial entre governo e terminais. As empresas ainda não foram ressarcidas adequadamente de todos os investimentos que fizeram nos terminais, o que subtrairia patrimônio de sua titularidade sem a devida compensação.
Essa contestação tem fundamento. Antes do novo marco regulatório do setor, houve uma morosidade por parte do governo federal em aprovar a realização de investimentos nas áreas. Isso significa que, quando acontecerem as novas licitações, as companhias ainda não terão amortizado todos os investimentos que fizeram. Isso porque os prazos mínimos para deduzir o que foi investido não terão ocorrido. Se a ideia era acelerar as concessões dos portos, não foi uma boa alternativa do governo deixar de renovar esses contratos por mais algum tempo, para que os terminais pudessem ter os investimentos amortizados. Talvez todo esse imbróglio pudesse ter sido evitado se o governo não tivesse sido tão intransigente.
O primeiro sinal de que a situação começou a desandar surgiu recentemente no Porto de Santos, que receberá o primeiro lote de licitação. As empresas portuárias do local já sinalizaram que entrarão na Justiça para suspender a licitação quando os editais das áreas em que operam forem lançados. A reivindicação é para que o governo adapte os contratos à antiga Lei dos Portos, de 1993. Uma medida que deve ser seguida por outros terminais, atrasando ainda mais a reforma.
Ao todo, são 161 áreas de arrendamentos em portos de todo o país. O primeiro bloco inclui 29 locais no Porto de Santos e cinco no Pará. No caso do Porto de Paranaguá, que está incluído no segundo lote de licitações, os problemas de contrato envolvem sete grandes companhias que, provavelmente, também entrarão na briga. Enquanto a reforma não vai para a frente, esses terminais operam por meio de liminares ou contratos emergenciais.
Outro problema que não foi avaliado pelo governo é que será muito improvável que as áreas de arrendamento que estiverem sendo contestadas na Justiça tenham interessados na concorrência, concluindo na falta de êxito da licitação. Somando o tempo hábil de avaliação do TCU com toda essa questão jurídica, a reforma não deve acontecer tão rapidamente como pretendia o governo federal. Há risco de o problema se arrastar até o segundo semestre, em plena campanha eleitoral.
André Luiz Bonat Cordeiro é advogado de Direito Administrativo e Aduaneiro da Sociedade de Advogados Alceu Machado, Sperb & Bonat Cordeiro.
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