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Constituinte e plebiscito: soluções ou confusões?

Depois da primeira onda de manifestações contra quase tudo e quase todos, a Presidência da República resolveu enfrentar alguns velhos problemas brasileiros. Duas medidas instalaram forte debate. A primeira foi o "processo constituinte" para a reforma política. Essa ideia durou menos de 12 horas, pois foi desmentida pela segunda, que defendeu um plebiscito sobre a tal reforma. Difícil é tentar descobrir qual das duas é a pior.

A Constituição é a lei fundamental de um país. Reflete a decisão política de se consolidar, em termos jurídicos, os assuntos mais importantes para a nação. Em países democráticos, ela resulta de movimentos sociais (a atual, promulgada em 1988, tem origem próxima nas Diretas Já, de 1983). Para assegurar sua permanência, a Constituição estabelece requisitos jurídicos para sua modificação: são as emendas constitucionais, que exigem votações qualificadas (quórum e rito) em ambas as casas do Congresso. Isso não significa a impossibilidade de se mudar a Constituição por outros modos (por exemplo, uma assembleia constituinte), mas sim que as emendas são o meio com legitimidade constitucional.

Porém, o que é um processo – ou uma assembleia – constituinte? É o exercício do poder político que visa a desconstituir a Constituição vigente e criar outra. Aqui, não há limites jurídicos: é a força política da assembleia que toma as decisões a respeito do que pode ser transformado em norma constitucional. Logo, é um erro falar-se em "processo constituinte" limitado. Ou se está diante de uma assembleia que tudo pode – e às instituições cumpre apenas assegurar a estabilidade para que o processo se desenvolva sem transtornos –, ou se está diante de uma fraude à Constituição, que pode se destinar a transpor os quóruns e ritos de votação diferenciada para as emendas.

Aliás, a notícia de uma assembleia constituinte dirigida traz à memória o "processo constituinte" de 1966-1967, quando a Presidência convocou "reunião extraordinária" do Congresso, com funcionamento de dezembro de 1966 a janeiro de 1967, a fim de examinar o projeto oficial do governo militar. Isto é, uma "assembleia" com prazo e limites materiais predeterminados. Deu no que deu; o resto é história.

Pois o plebiscito para a reforma política não tem melhor sorte. Ora, o plebiscito é uma escolha binária – sim ou não – a respeito de temas de razoável compreensão pública. Contudo, quem conhece os assuntos da reforma? Quem sabe explicar com clareza os votos "de lista" e os "distritais"? Quantos já têm opinião a respeito do financiamento de campanhas – e como se daria o "financiamento público"? Aliás, quem é o sujeito genial que vai elaborar as perguntas? Quantas serão? Só oito resolvem ou seria melhor 15? Mais ainda: o resultado do plebiscito não se transforma nem em lei nem em Constituição. Só gera uma resposta, que pode inspirar o legislador, mas também pode resultar em absolutamente nada. Por fim: para incidir nas eleições de 2014, a reforma precisa ser aprovada um ano antes – são quatro meses para instruir a população, fazer o plebiscito e transformá-lo em emenda constitucional promulgada. Seria interessante ressuscitar o Houdini, porque essa mágica exige grandes especialistas.

Mas o que revelam ambos os casos? Por um lado, é um sério caso de desestima constitucional: a falta de prestígio à Constituição brasileira, tratada como se fosse algo do cardápio ordinário de ações políticas do governo. Por outro, que a Presidência ainda não percebeu o que efetivamente se passa nas ruas.

Egon Bockmann Moreira, advogado e doutor em Direito, é professor da Faculdade de Direito da UFPR.

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