| Foto: André Rodrigues / Gazeta do Povo

Periodicamente, as universidades estatais brasileiras sofrem contingenciamentos financeiros. Quase sempre os governos depois suspendem a restrição, mas o desastre já foi cometido. Pior que pouco recurso é a intermitência que impõe o funcionamento irregular da universidade. São cortes nas veias do país, porque o principal fator da produção econômica é o conhecimento, e tirar apoio das universidades asfixia o Brasil.

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Diante da previsível crise fiscal que atravessamos, é preciso reduzir gastos públicos, mas sem deixar universidades definharem, porque isso significa extenuar o futuro. Lutar por mais recursos é obrigação das universidades e não motivação corporativa. Mas esse esforço precisa entender a realidade das restrições fiscais. Se não assimilar isso, a universidade não estará compreendendo a realidade, e não terá justificativa para receber mais recursos.

Depois de meses sob asfixia, o governo anuncia que, graças à recuperação de receitas, está suspendendo o contingenciamento de verbas

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Uma das principais tarefas dos centros universitários é usar o seu potencial intelectual e político para indicar onde os orçamentos públicos devem reduzir gastos e mordomias. A universidade precisa lutar contra a corrupção e desperdícios, fontes dos déficits que agora impõem contingenciamento. Como centro máximo de geração do conhecimento, ela deve entender também que seu maior e pior contingenciamento é estrutural: o corte de cérebros que a educação de base impõe.

Desde a fundação de nossa primeira universidade, em 1922, entre 20 milhões a 30 milhões de brasileiros viveram – e alguns ainda vivem – em estado de analfabetismo. Isso representa um gravíssimo contingenciamento que professores, alunos e servidores universitários ignoram. Nas mobilizações não se vê cartazes pedindo programas pela erradicação do analfabetismo nem aumento no valor do piso nacional do salário do professor da educação básica.

A universidade, apesar de ser a base da formação do saber nacional, não aplica o conhecimento para entender e denunciar que o contingenciamento estrutural é ainda mais grave que o fiscal. Deveria entender outros contingenciamentos que também amarram as universidades como o corporativismo, prioridades equivocadas, preferência por narrativas falsas, submissão a siglas no lugar de participação no debate de ideias.

Depois de meses sob asfixia, o governo anuncia que, graças à recuperação de receitas, está suspendendo o contingenciamento de verbas, sem pedir desculpas pelos estragos irrecuperáveis das interrupções sofridas nesse período. Com esses recursos as universidades se acomodarão porque reivindicam apenas o fim do contingenciamento fiscal, e não percebem a gravidade dos contingenciamentos estruturais que seguem impedindo o desempenho de toda sua potência.

Cristovam Buarque é professor emérito da Universidade de Brasília.

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