Esteve em destaque, recentemente, a discussão sobre a constitucionalidade da contribuição social de 10% sobre o FGTS nos casos de demissão sem justa causa, o chamado “adicional do FGTS”. O debate levado ao Supremo, com o peso de uma repercussão geral – o que significa ampliar a decisão para todos os processos que tratam do mesmo tema –, discutiu se a contribuição poderia permanecer em vigor mesmo após ter cumprido com a finalidade.
O tema tem impacto direto nas empresas, que poderão recuperar valores recolhidos no passado, até a extinção da contribuição, em janeiro de 2020. A União estima que o orçamento das discussões judiciais sobre a matéria seja de aproximadamente R$ 36 bilhões.
A contribuição de 10% havia sido instituída para viabilizar a recomposição dos expurgos inflacionários das contas vinculadas ao FGTS – que, à época da promulgação da lei, representava um passivo bilionário para a União. Neste entendimento, a manutenção da cobrança apenas seria constitucional enquanto os recursos se destinassem a cumprir com este escopo. Sob estas lentes, considerando que Caixa Econômica Federal havia informado que as contas foram devidamente recompostas em julho de 2012, sustentava-se que a partir daquele mês a norma teria perdido seu fundamento de validade, revestindo-se de inconstitucionalidade.
Não foi este, porém, o entendimento que preponderou no Supremo Tribunal Federal, no recente julgamento realizado no mês de agosto. O voto vencedor do ministro Alexandre de Moraes, por linhas tortas, entendeu que a finalidade da contribuição é mais ampla do que a mera recomposição dos expurgos inflacionários: presta-se à preservação do direito social dos trabalhadores e, portanto, a contribuição poderia permanecer em vigor. O relator, ministro Marco Aurélio Mello, havia votado pela inconstitucionalidade da cobrança, mas restou vencido.
No entanto, em pouco tempo, o Supremo haverá de enfrentar uma outra tese, em que se contesta a validade da cobrança da contribuição não pelo cumprimento de finalidade, mas pela incompatibilidade da base de cálculo escolhida com o texto constitucional.
Atualmente, há recursos extraordinários para serem julgados, em sede de repercussão geral, que questionam a base de cálculo de outras contribuições – a exemplo do Sebrae e do Incra. Estes mesmos questionamentos devem se estender, em breve, à contribuição adicional do FGTS.
O argumento por trás da tese é o de que a base de cálculo da contribuição instituída em 2001 – que corresponde ao valor de “todos os depósitos devidos, referentes ao FGTS, durante a vigência do contrato de trabalho” – não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas na Constituição.
A explicação para a incompatibilidade está em que, à época da promulgação da Lei Complementar 110/2001, as possíveis bases de cálculo das contribuições não estavam indicadas no texto constitucional e, portanto, não havia impedimento para que a base de cálculo prevista para a contribuição adicional do FTGS fosse o valor dos depósitos devidos na vigência do contrato de trabalho. As amarras para as bases de cálculo das contribuições sociais gerais vieram meses depois da criação do tributo, com a Emenda Constitucional 33/2001, a pretexto, sobretudo, de pôr fim à insegurança jurídica que permeava a criação de novas contribuições.
O artigo 149, na redação dada pela emenda constitucional, indica que as bases de cálculo das contribuições sociais gerais com alíquotas apenas podem ser: o faturamento; a receita bruta; o valor da operação; ou o valor aduaneiro. Notadamente, o valor dos depósitos do FGTS devidos na vigência do contrato de trabalho não se enquadra em nenhuma destas bases de cálculo. Após a emenda constitucional – que revoga a norma tributária –, não mais haveria fundamento para a manutenção da contribuição adicional do FGTS.
Considerando que a questão não tarda a subir para o Supremo Tribunal Federal, podemos dizer que a contribuição adicional do FGTS estará em pauta por mais um bom tempo. A discussão ainda não chegou ao fim. Ainda há esperança de que a exigência fiscal seja declarada inconstitucional. A conferir se, na próxima oportunidade em que for instada a se manifestar, a decisão da suprema corte respeitará a limitação das possíveis bases de cálculo idealizada pelo constituinte derivado, tal como se espera.
Matheus Monteiro Morosini é advogado e presidente do Instituto de Direito Tributário do Paraná. João Ricardo Clève Kravetz é graduando em Direito e em Ciências Contábeis.
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