Imagem ilustrativa.| Foto: Exército/divulgação
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“A relação entre civis e militares são mais do que apenas a capacidade de líderes civis controlarem as Forças Armadas. Estas relações, propriamente definidas, abrangem como a sociedade vê suas forças militares, assim como a forma em que o profissional militar identifica a sociedade civil que defende.” (Francis G. Hoffman, Consultor de Defesa do Exército dos EUA)

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O chamado “controle civil” das Forças Armadas é uma falácia visionária, que tem sido alardeada como condição sine qua non para o pleno funcionamento das modernas democracias. No Brasil, essa crença vem sendo trabalhada no inconsciente coletivo pela inteligentzia desde o período do regime militar, e segue hoje sendo apregoada como “panacéia democrática” na imprensa, em simpósios acadêmicos, campanhas eleitorais e convescotes de intelectuais de esquerda.

De fato, o que essa ideia tem conseguido é reforçar os ranços ideológicos, acentuando a polarização política, além de manter as relações entre civis e militares sob permanente tensão. Razão disso, primeiramente, é o número cada vez menor de líderes políticos civis com visão de Estado e senso estratégico, capazes e eficazes na condução dos objetivos nacionais. Hoje, mais do que antes em qualquer tempo, os políticos brasileiros eximem-se de suas reais responsabilidades quanto à segurança nacional ou às definições dos rumos geopolíticos do país. Pior, ainda: entrincheirados em um revanchismo ideológico surdo, nossos líderes permanecem esgrimindo preconceitos anacrônicos do tempo do regime militar, insistindo em uma permanente narrativa de ameaças de golpe, e justificando o trabalho de enfraquecimento das Forças Armadas como “defesa da democracia”. Essa obsessão em alijar o estamento militar da política provocou também outro efeito colateral, de todo indesejado, mas quase natural: o maior envolvimento das Forças Armadas na política partidária, visto que competências militares de peso foram praticamente defenestradas das decisões político/institucionais de Estado, desde a criação do Ministério da Defesa.

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A última forma de poder na política mundial é o poder militar, e os elaboradores de políticas têm que saber usá-lo.

A expectativa justificada de que as elites militares de uma república sejam apolíticas, e se mantenham acima das divergências político partidárias, não pode ser atendida se a cúpula da política nacional opta por descuidar, e não ouvir, seu próprio poder militar. Na verdade, nossas elites parecem haver esquecido, ou entendem como de pouca relevância, as decisivas participações dos militares brasileiros em defesa da democracia, nas crises político sociais vivenciadas pela nação. As lideranças civis têm ignorado não só a postura atual das nossas Forças Armadas, mas também seus compromissos históricos, de jamais promoverem um ditador fardado, de privilegiarem soluções políticas sem derramamento de sangue, e de sempre contarem com o apoio popular em suas manifestações.

O panorama se agrava no meio político, onde impera a ignorância quanto aos temas geoestratégicos, além do total desconhecimento sobre a formação e a capacitação de quadros – inclusive civis – para o cumprimento da missão constitucional de segurança e defesa da pátria.  Entretanto, em nome dessa antiquada preocupação com um cerceamento do “poder dos militares” (sem justificativas doutrinárias fundamentadas, a não ser ideológicas), estrategistas de tribuna não se cansam de alardear soluções esdrúxulas, como criação de uma Guarda Nacional, ou a extinção das tropas de Operações Especiais.

No Brasil, não temos elites civis realmente comprometidas com os temas de segurança e defesa, e não há universo onde recrutá-las. 

Incapazes sequer de listar as ameaças que o país enfrenta neste primeiro quartel do Século XXI, e a reboque de narrativas exaltando uma política externa capaz de em seis meses nos indispor com todas os grandes atores mundiais, nossos parlamentares não distinguem diplomacia soft power de negociação sindicalista. Na ânsia de impor um poder civil às Forças Armadas, em “defesa da democracia”, eles questionam a legitimidade da presença de militares no governo, ou até impedem a nomeação de oficiais do Exército como auxiliares do presidente (prática tradicional em todas as democracias ocidentais). Como se o uso da farda e não a competência profissional importasse; como se o exercício de funções administrativas por militares ameaçasse a segurança política do governo; e eles sequer aventam a hipótese de que medidas “civilistas” mesquinhas e pouco inteligentes, além de ineficazes, só trazem como consequência a publicidade – inclusive internacional – da precariedade do nosso poder militar.

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A título de informação, em média cerca de 50 mil militares, da ativa e da reserva das Forças Armadas, costumam integrar as organizações governamentais nos EUA. No Brasil, a imprensa “especializada” considera atentado à democracia o fato de 6 mil militares terem participado do governo passado, sendo que 2/3 desse efetivo eram de policiais militares, profissionais com limitada capacidade de influência política no âmbito federal.

Não menos importante é lembrar que os nossos “defensores da democracia”, costumam se concentrar no “controle civil”, ignorando completamente a lógica necessidade de um “controle civil eficaz”. Após a II Guerra Mundial, os cientistas políticos descobriram que a liderança civil das Forças Armadas é cada vez mais condicionada e dependente da capacidade de liderança competente dos civis. No Brasil, não temos elites civis realmente comprometidas com os temas de segurança e defesa, e não há universo onde recrutá-las. Hoje, nossas autoridades eleitas ou nomeadas não passam de leigos, que dependem da liderança e do conhecimento técnico profissional dos militares, para atualizar as políticas e fundamentar decisão oportunas, quanto aos temas geopolíticos e de segurança nacional.

A última forma de poder na política mundial é o poder militar, e os elaboradores de políticas têm que saber usá-lo, nesse mundo de conflitos ambíguos, guerreiros indetectáveis e tecnologias letais. Ainda que seja pouco provável de imediato que o Brasil se envolva em um conflito armado, o atual caos global exige maior prontidão contra ameaças externas, e menos “invencionices democráticas” domésticas. Muitos recursos naturais do planeta devem se esgotar já neste século, e não é alarmista a hipótese de uma redistribuição manu militare das fontes desses recursos, ditada pela preservação da qualidade de vida de nações mais poderosas. A análise estratégica de uma ameaça, apenas – a internacionalização da Amazônia – pode nos revelar o crime de lesa-pátria que é insistir em tirar poder das nossas Forças Armadas.

Em democracias maduras, soldados não têm por que não obedecer a leis justas e juízes imparciais. Revoluções independem de artigos na Constituição, e o controle civil sobre militares se obtém com líderes civis eficazes, que ainda não temos.

Marco Aurélio Vieira, general da reserva do Exército,  foi comandante da Brigada de Operações Especiais e da Brigada de Infantaria Paraquedista.

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]