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Já que não dissemos "não"

Por que não dissemos "não", quando vieram com essa história de ter a Copa do Mundo em Curitiba? O ufanismo político local (município e estado) podia ser sintetizado na frase reinante: agora o mundo vai ver como Curitiba é boa. Para quê? E o complemento era que os investimentos – públicos, mas também privados, claro – tirariam do papel obras importantes. Cadê? No dia 16 de junho começa a Copa na cidade. Dez dias depois, os turistas irão embora.

E aí entra em cena quem realmente importa: você. Aos poucos nos daremos conta das obras inacabadas, as várias necessárias e não realizadas, e as construídas desnecessárias. Então nos perguntaremos: por quê? Por que não dissemos "não", quando vieram com essa história de ter a Copa do Mundo em Curitiba?

Leia a opinião completa de Fábio Duarte, professor do Mestrado e Doutorado em Gestão Urbana na PUCPR.

Poucos temas relacionados à cidade foram tão repetidos quanto os da Copa. Não há dúvida: o temor, com riscos de se transformar em ódio, tem sido mais frequente que o otimismo. Meio ao ruim certeiro e aos eventuais ganhos diminutos, a cidade, que não nasceu no dia da sua confirmação como uma das sedes do evento no Brasil, tem seguido seu mesmo caminho desde há muito tempo. Impossível imaginar que jamais teríamos um alargamento da Avenida das Torres, que não concluíssemos com a necessidade de viaduto ou trincheira na mesma avenida e que a Rodoferroviária um dia não recebesse reformas. Do mesmo modo, já conhecíamos canteiros verde-amarelos, Jardim Botânico iluminado civicamente e hotéis lotados.

Tudo é conhecido: das vitrines e das ruas enfeitadas sai o Papai Noel e surge o Neymar; termina a Marcha para Cristo e surge a Fan Fest, Erasmo Carlos cantará na Pedreira do mesmo jeitão como sempre cantou; partirão os nigerianos e iranianos, mas permanecerão os estrangeiros do Haiti. Para uma coisa ou para outra já sabemos tudo: como organizar multidões, como decorar vias, como se preparar para casas cheias, como reforçar a segurança, como adaptar o trânsito. Então, estamos preparados. Lógico que estamos. Se algo der errado, com o que devemos nos preocupar? Com a nossa imagem no exterior ou com a capacidade de nossos gestores?

Não vale nem mesmo tentar responder. Tomemos o exemplo da Olímpiada de Inverno de Sochi, na Rússia, em 2014. Poucos lembram dessa cidade; tive de confirmar sua grafia na internet. No nosso caso, não contamos com presença na mídia, nem mesmo antes do evento: os estrangeiros que leram algo sobre o Parque Tanguá ou Tingui são apenas os que aqui virão assistir aos jogos dos seus países. No noticiário internacional, Curitiba quase não é citada.

Tudo passa; o que não passa é nossa dependência do bom gestor. Se os prejuízos forem muitos, passaremos um bom tempo tentando exorcizar esse evento; se tudo funcionar corretamente, podemos nos acostumar mal e exigir da prefeitura tamanho zelo também para o cotidiano de Curitiba.

Jornais, tevê e academia borbulharam-se em discussões sobre a Copa: em postura acrítica, relatando fatos e cronogramas; ou vociferando contra um legado prometido que não viria jamais. Acredito que não seja heresia fazer um esforço para encontrar algo bom no mundo pós-Copa. Penso, penso e acho algumas coisas que exemplificam esse otimismo. A adoção de determinadas regras técnicas na elaboração de projetos, construção e operação de infraestruturas impostas pela Fifa permanecerão como acervo profissional. Projetos que desejávamos, mas que não se implementavam por falta de deadline, se fizeram reais. Curitiba, que não integrava redes de aluguel de imóveis em nível internacional, agora assimila essa prática e apresenta seus produtos imobiliários segundo novo padrão.

A arquitetura trazida para os estádios da Copa também contribui para aquilo que seguirá quando ficarmos sozinhos novamente. A Arena abrigará jogos locais, mas, mais que isso, ajudará a inserir Curitiba em circuitos de megashows internacionais. No gerenciamento de obras de engenharia, o volume com que se trabalhou e as atrapalhadas vivenciadas deixarão um legado técnico entre nossos profissionais. Pela primeira vez tivemos população e jornal exercendo a crítica arquitetônica e a crítica urbanística: todo mundo aprendeu que ícones, como o viaduto estaiado – além de justificados pela função –, necessitam de esmeros paisagísticos e tomadas visuais. Avançamos, sim!

Clovis Ultramari, arquiteto, é professor do Programa de Pós-Graduação em Gestão Urbana da PUCPR.

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