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Síntese do dia 2

CPMF: provisória ou permanente?

A CPMF é um tributo curioso. Chegou a ser adotada em vários países, como um instrumento emergencial de recuperação das contas públicas. Hoje, porém, além do Brasil, apenas Colômbia e Venezuela mantêm sua cobrança, o que revela uma experiência que parece não ter inspirado a formação de seguidores. A percepção geral é de que a CPMF é um tributo de péssima qualidade, por reunir dois defeitos graves: cumulatividade e regressividade.

Ocorre a cumulatividade porque a CPMF incide sobre todas as fases da cadeia econômica. Grava o preço final de bens e serviços numa alíquota muito superior à legal. Assim, quanto mais longa a cadeia produtiva e quanto mais elaborado o produto ou serviço, maior será a carga da CPMF. Trata-se da incidência "em cascata" sobre cada uma das fases da produção e circulação, que não prevê compensação pelo tributo cobrado nas operações anteriores.

O caráter regressivo da CPMF reside na impossibilidade de diferenciar gastos essenciais dos gastos supérfluos e de discriminar contribuintes por nível de renda. Além disso, a contribuição é transferida ao preço dos bens e serviços, o que onera pesadamente os segmentos sociais de baixa renda. Apesar de reconhecermos que o peso da tributação tende a se concentrar sobre os que têm mais recursos circulando no sistema bancário, isso não invalida o fato de que a CPMF compromete os requisitos de progressividade e seletividade tão caros ao sistema tributário que defendemos.

No caso brasileiro, a adoção da CPMF tornou-se uma experiência bem sucedida em razão da elevada eficiência arrecadatória, característica que não foi ameaçada nem mesmo quando os níveis de inflação caíram para patamares civilizados, ou quando o governo, em 1999, elevou sua alíquota de 0,2% para 0,38%. O desempenho da CPMF desmentiu todas as teorias e previsões de que sua adoção provocaria a"desintermediação" bancária e a explosão da inflação. O sucesso da CPMF, no Brasil, reflete a experiência ímpar de um país que conviveu por várias décadas com taxas de inflação inconcebíveis para o resto do mundo, num regime financeiro indexado, sem jamais abandonar os ativos reais em moeda nacional. A intermediação bancária e o uso do cheque são hábitos que impregnaram a cultura brasileira e que, em boa parte, explicam o desempenho desse tributo.

Outro aspecto digno de nota na experiência brasileira refere-se ao papel da CPMF como um instrumento poderoso para facilitar a fiscalização tributária. O cruzamento das informações da CPMF com as relativas ao imposto de renda tem permitido identificar milhares de fraudes contra o fisco. De outra forma, muitas dessas fraudes dificilmente seriam detectadas pela Receita Federal, devido à insuficiência do contingente de fiscais e à inoperância do sistema de investigações frente aos esquemas altamente sofisticados e complexos de sonegação tributária.

Diante desse quadro, a proposta de prorrogação da CPMF tornou-se um assunto emblemático na agenda política do país. Não se trata apenas de dar sobrevida a um imposto considerado de má qualidade. Trata-se de eliminar, de forma quase imediata, uma fonte de recursos da ordem de R$ 36 bilhões, que tem sido importante para resguardar o equilíbrio das contas públicas e que se revelou um valioso instrumento para coibir a sonegação endêmica que sempre prejudicou o país e tornou nossa carga tributária extremamente injusta e mal distribuída.

O bom desempenho da economia no período recente está pautado num profundo esforço de estabilização econômica, com redução da inflação, equilíbrio das contas públicas e diminuição de nosso nível de endividamento interno e externo em relação ao PIB. Sem dúvida, esse quadro deve ser resguardado, sob pena de serem comprometidos os avanços até aqui alcançados em nossos indicadores sociais e econômicos.

Por todos esses motivos, e considerando prós e contras, entendo que sua pura e simples eliminação não se revela como a melhor atitude. A melhor política seria prever um programa de redução gradual da alíquota da CPMF, até um percentual de 0,1%, cujos recursos seriam integralmente destinados ao Fundo de Combate à Pobreza.

Dessa forma, resguardar-se-iam o caráter fiscalizatório do tributo e sua vocação para o atendimento de demandas emergenciais da sociedade brasileira. Seria importante também que a redução ocorresse ao longo de um período pré-determinado, suficiente para introdução de novas alternativas de financiamento do gasto público por meio de uma reforma tributária abrangente e comprometida com a adoção de um sistema mais justo e que favoreça os investimentos e o crescimento da atividade produtiva nacional.

Dr. Rosinha é deputado federal (PT-PR) e vice-presidente do Parlamento do Mercosul. dr.rosinha@terra.com.brwww.drrosinha.com.br

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