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opinião do dia 1

Crianças anencéfalas podem ser abortadas?

Mesmo nos casos em que a lesão leva à morte poucos minutos após o nascimento, seria esse um motivo para considerarmos essa vida humana sem significado?

Em breve teremos o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF)-54, na qual se solicita que não seja considerado crime o aborto (no processo, chamado de "antecipação terapêutica do parto") de crianças portadoras de anencefalia. Ninguém pode negar o sofrimento dos pais quando recebem o diagnóstico de que o seu filho é portador de anencefalia. Mas colocam-se duas importantes questões: 1. Tem essa criança, apesar de sua forte deficiência, direito à vida? Pode ela ser considerada uma "não pessoa", ou, como dizem alguns partidários do seu aborto, um "sub-humano"? 2. Representaria o aborto dessa criança, efetivamente, um consolo ou uma diminuição de sofrimento para os seus pais?

Anencefalia é uma má-formação congênita que ocorre já no primeiro mês de gestação, que evolui para a ausência de parte variável do encéfalo. Ora, má-formação é um processo que escapou à regulação normal. Apresenta variabilidade individual, e, embora sempre seja uma anomalia grave, há graus, sendo impossível prever a evolução da criança em cada caso concreto.

Tornou-se conhecido no Brasil o caso da menina Marcela de Jesus, que sobreviveu por um ano e oito meses. Sendo esse caso tão emblemático, no decorrer das audiências públicas relativas à ADPF 54 houve a tentativa de se descaracterizar a má-formação da menina como sendo anencefalia. Entretanto, todos os médicos que examinaram Marcela, através de diferentes tipos de exames, coincidem no diagnóstico.

Também alguns especialistas internacionais, a quem enviamos os exames de Marcela, a consideraram "caso típico de anencefalia". De qualquer modo, se tivesse havido nesse caso um erro de diagnóstico, a situação se mostraria ainda mais grave. Seria um indício claro de não haver segurança no diagnóstico de anencefalia, nem mesmo quando a criança já tem 1 ano. Como seria possível um diagnóstico seguro intraútero?

Marcela dava mostras de reconhecer a mãe, mostrando aflição e chorando na sua ausência. Respirava por conta própria e comia sua papinha, até com preferências alimentares, gostando de algumas comidas e rejeitando outras. Não podemos saber se era capaz de amar, mas certamente foi muito amada.

Mesmo nos casos em que a lesão leva à morte poucos minutos após o nascimento, seria esse um motivo para considerarmos essa vida humana sem significado? Se dissermos que se trata de uma "vida inútil", não seria um sinal claro de termos uma visão utilitarista da vida humana?

A dignidade é reconhecida pelos pais em seus filhos, e são estabelecidos laços de amor desde o início da gestação. O aborto é uma falsa solução para o sofrimento da mãe. Não se pode "deletar" uma criança como se nunca tivesse existido. Recebida com amor, deixará nos pais a recordação de terem feito por ela tudo o que era possível. Ao contrário, se abortada, será um permanente peso na consciência, reconhecido ou não.

Outro aspecto muito sério do debate é a usurpação de poderes do Congresso Nacional que tem sido feita pelo STF. Cabe ao Legislativo o debate sobre aborto, e ninguém pode acusá-lo de não o estar fazendo. Se não saiu nenhuma lei a respeito nos últimos anos, deve-se ao fato de que os projetos de lei que assim pretendiam foram fragorosamente derrotados em sua tramitação. Portanto não há aí "omissão legislativa" que possa ser alegada pelo STF, mas respeito ao pensamento do povo brasileiro, por seus legítimos representantes, democraticamente eleitos.

Também tramitam no Congresso Nacional dois projetos específicos sobre a questão do aborto do anencéfalo, o PL 4.403/2004 e o PLS 50/2011. Portanto não há qualquer justificativa para que o STF assuma o papel de legislador, contrariando a nossa Constituição.

Quem tiver interesse em saber mais sobre o assunto pode acessar o o canal vidaparatodos, no Youtube http://www.youtube.com/user/vidaparatodos

Lenise Garcia, professora do Departamento de Biologia Celular da Universidade de Brasília, é presidente do Movimento Nacional da Cidadania pela Vida – Brasil sem Aborto.

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