A recente decisão da Volkswagen do Brasil em demitir 1.800 trabalhadores na planta de São Bernardo do Campo, SP e mais 500 trabalhadores na planta de São José dos Pinhais-PR, traz à tona a questão da crise na indústria automobilística. Essa é uma crise anunciada há muito tempo. Na minha tese de doutorado em economia defendida em 2003, na UFPR, sobre a organização produtiva na indústria automobilística e organização sindical, fiz um estudo comparativo sobre as plantas da Volkswagen de São Bernardo do Campo e São José dos Pinhais, na qual demonstrei que o modelo produtivo da Volkswagen no Brasil era a planta de São José dos Pinhais e que o futuro da planta de São Bernardo seria passar por uma profunda reestruturação produtiva para chegar ao modelo de produção enxuta de São José dos Pinhais. Isto porque, na época, a planta de São Bernardo tinha 15.000 trabalhadores e produzia 900 carros/dia, enquanto a planta de São José dos Pinhais, com apenas 2.800 trabalhadores, produzia 450 carros/dia. A planta de SBC é da década de 50 e a de SJP é da década de 90. O modelo da produção enxuta das plantas dos anos 90, encetada pela nova política de concorrência entre as montadoras mundiais, foi viabilizada por uma política governamental de incentivos equivocada, conhecida por guerra fiscal, em que os governos locais, estaduais e federal, abandonaram qualquer perspectiva de política industrial e incentivaram essa guerra de quem dava mais atraía as montadoras, sem qualquer exigência. Dessa forma foram feitas doações de grandes áreas de terras, infra-estrutura, modernização de portos, dilação de prazos no recolhimento de ICMS, abolição de impostos de importação e exportação. Isso foi o paraíso das montadoras, que chegaram até a transferirem plantas como ocorreu com a saída da Ford do RS para a Bahia. O caráter da atual crise está localizado na questão da desvalorização cambial, que com a queda do dólar fez cair as exportações das plantas construídas para esse fim. É uma questão conjuntural da economia que afeta a vida de milhares de trabalhadores e suas famílias, sem qualquer medida de proteção por parte do Estado. Com essa política suicida de benefícios e incentivos fiscais adotada, o Estado perdeu a capacidade de fazer política, fragilizando seu poder de intervenção, tornando a política como arte de resolver problemas sociais, na arte de criar problemas sociais. À medida que nos acordos com as montadoras, altamente beneficiadas em seus lucros, nos tempos da exportação em ascensão, não se colocou qualquer cláusula de proteção ao trabalho.
Agora, o Estado, via BNDES, tenta bloquear um empréstimo aprovado para uma das maiores montadoras do país, a Volkswagen, tentando vincular a liberação à manutenção da fábrica de SBC. Há uma divergência no governo, quando o presidente do BNDES tenta defender a liberação do empréstimo e o ministro do Trabalho, que tenta condicionar o empréstimo à manutenção da fábrica de SBC, admite que não tem como evitar a reestruturação da planta de SBC que implica em demissões de 6 mil trabalhadores até 2008. Logo, a fábrica que tem hoje 12.000 trabalhadores ficará, em 2008, com apenas 6.000. É bom manter a memória viva e lembrar que foi o atual Ministro do Trabalho, na condição de presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de SBC em 2001, quem negociou, na Alemanha, um contrato de trabalho somente até 2006 sem demissões.
É por isso que hoje ele aceita que as demissões são necessárias para manter a fábrica em SBC para torná-la competitiva. A pergunta que fica no ar é quanto às plantas que já são competitivas e continuam demitindo. Vão receber, via BNDES, mais dinheiro público que é originário do FGTS, saído das costas dos trabalhadores para demitir trabalhadores para salvá-las dessa crise de exportações e garantir seus altos lucros?
Essa crise está eclodindo exatamente em um ano eleitoral, quando serão eleitos os futuros dirigentes da nação e não vemos nos programas de governo qualquer menção a uma mudança da política em relação à indústria automobilística e ao grande capital especulativo, o que é uma demonstração real de que a economia congelou a política e os grandes grupos econômicos continuam determinando as políticas do Estado em seu benefício, mesmo não tendo direito a voto.
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