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Em 8 de dezembro de 2012, no fim da gestão do prefeito Luciano Ducci, foi destruído mais um patrimônio arquitetônico da cidade de Curitiba. Um processo decidido em 36 horas, com o aval da prefeitura, enquanto se discutia se este poderia ser classificado como Unidade de Interesse de Preservação (UIP), o que acabou não acontecendo. Vinha abaixo o Hospital Psiquiátrico Bom Retiro, com suas janelas, portas, piso e forro em madeira nobre, além de mobiliário deixado lá dentro, na pressa de se demolir a edificação.

Não foram somente paredes de tijolos derrubadas, mas sim um pedaço da memória de Curitiba. Um hospital erguido numa área de 60 mil metros quadrados, que deu nome ao bairro do Bom Retiro e que funcionou por 67 anos. Parte deste terreno foi vendido ao Grupo Angeloni, que anunciou a construção de um hipermercado, ocupando uma área de 17 mil metros quadrados.

Para muitos, a Federação Espirita do Paraná (FEP) e seus conselheiros traíram a memória de Lins de Vasconcelos, que foi o grande patrono da compra do terreno em 1924 e da construção do hospital, inaugurado em 1946, com o apoio financeiro de outros seguidores. Há quem questione a legalidade da venda, tendo em vista que o terreno foi comprado com dinheiro de doação para um projeto filantrópico onde estaria a preocupação com a doutrina espírita, sabendo que o investimento no local servirá ao consumo, que pode ser traduzido como materialismo – o oposto do que pregam.

Cidadãos urbanos querem espaços de convívio, de interação, de afetividade

Nos mais de 90 anos de existência da área, impressiona-nos o grande bosque preservado de cerca de 40 mil metros quadrados, com araucárias, três nascentes e dois córregos, sendo que estas águas limpas alimentam o já maltratado Rio Belém, passando alguns metros abaixo. O bosque é também a casa de aves, como o jacu, e de saguis, vistos constantemente por vizinhos do terreno. Seu serviço ambiental na região é inestimável, pois a vegetação absorve o carbono do intenso tráfego de veículos, protege as nascentes e faz parte de um corredor biológico formado por outras áreas verdes na região, como o Parque São Lourenço e os bosques Zaninelli (Unilivre), Alemão e do Papa.

O projeto do Angeloni terá 30 mil metros de área construída, com escavações para dois estacionamentos, um centro comercial e 12 lojas na praça de alimentação. Escavações estas que comprometerão o lençol freático do terreno e também o bosque no fundo do terreno, que será prensado e sufocado pelo imenso paredão do hipermercado. Já as árvores isoladas, em primeiro plano, serão todas cortadas. Sobrará intacta somente a área de bosque que ainda pertence à FEP. Sem dúvida haverá grande aumento de tráfego, com caminhões entrando e saindo, gerando mais poluição e caos no trânsito. Tudo isso próximo a outro supermercado existente a duas quadras dali!

Este projeto levou a população a organizar um movimento nas mídias sociais, denominado “A causa mais bonita da cidade” e reivindicando junto ao Angeloni, FEP e prefeitura que seja cancelado o projeto do hipermercado e que se faça o Parque do Bom Retiro, ocupando todo o terreno de 60 mil metros quadrados. A causa já tem apoio de 6 mil pessoas – em 2012, após a demolição, organizou-se um abaixo-assinado para a criação do parque, contando hoje com quase 5 mil assinaturas.

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A população de Curitiba, vendo seu patrimônio natural e cultural sendo engolido pela exploração imobiliária, deseja um parque inteiro, sem um caixote de concreto no meio. Não quer arriscar que, depois de o hipermercado ser construído, a FEP ceda a outras incorporadoras, permitindo que sejam erguidas torres comerciais e residenciais no local, como estava previsto no projeto original da incorporadora Invespark, negócio desfeito com a FEP.

Recentemente, divulgou-se que o novo templo da Igreja Universal do Reino de Deus construído no bairro do Rebouças – onde também foi destruído um patrimônio da arquitetura industrial, a antiga fábrica da Matte Leão – não fez nem as medidas mitigadoras para reduzir os efeitos negativos no entorno do empreendimento, nem as medidas compensatórias, para compensar os impactos negativos não mitigáveis!

Cidadãos urbanos querem espaços de convívio, de interação, de afetividade! O argumento de geração de empregos e valorização da área com um hipermercado não se sustenta, pois um parque valoriza muito mais a região. Também atrai mais turismo e estimula pequenos negócios, ao contrário dos que são engolidos por grandes centros de consumo. Estes geram empregos mais decentes e sustentáveis, ao contrário dos precários e de alta rotatividade de hipermercados.

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Como sugestão de Claudio Oliver, da ONG Casa da Videira, “o parque poderia concentrar todos os sabores e saberes da agricultura urbana, dos processos de agrofloresta, da utilização de espaços impermeabilizados para a introdução de técnicas de produção vertical de alimentos, de recuperação de solo, de re-encaminhamento de lixo orgânico para a produção de adubo, organoponia e solo, de aquaponia, e aí, sim, abastecer de vida e comida de verdade. Poder-se-ia criar corredores de vida silvestre, espaços de implantação de horto regional e produção de mudas nativas. Espaço para pedalar e viver, encontrar e respirar, abastecendo de energia e paz uma população com medo”.

É dever do prefeito e vereadores ouvir a população que os colocou no poder, pois isso não significa dar uma carta em branco para fazer o que querem de acordo com interesses apenas imobiliários. Como servidores públicos que são, devem defender os interesses públicos e não privados. Sem dizer que um projeto como este poderia colocar Curitiba novamente na vanguarda da inovação, pois não há proposta semelhante no Brasil. Os envolvidos na causa aguardam o convite do prefeito Rafael Greca, FEP e Angeloni para uma discussão de como os moradores desta cidade podem ter o seu parque inteiro, pleno, preservado, inovador e solidário!

Eloy F. Casagrande Jr., professor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), é coordenador do projeto Escritório Verde e organizou o primeiro abaixo-assinado para a criação do Parque do Bom Retiro, em 2012.
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