Tem razão o pesquisador residente Karl Giberson do Stonehill College (Estados Unidos), quando afirmou em seu artigo "Darwin ou Deus? Os cristãos podem ter ambos" (Gazeta, 4/5) que a evidência a favor da teoria da evolução de Darwin nas últimas décadas se tornou tão forte que praticamente toda a oposição a ela, dentro da comunidade científica desapareceu. Por outro lado, o autor mostra desconhecer a figura de tão proeminente cientista quando diz que "a afirmação de que Darwin substitui Deus é simplesmente falsa". Como veremos, ela é verdadeira.
Darwin embarcou no HMS Beagle em 1831, retornando cinco anos depois, após visitar diversos continentes, inclusive o Brasil. A publicação de seu livro A Origem das Espécies, somente se deu em 1859, portanto, já se passaram 155 anos e, inacreditavelmente, ficamos sabendo no artigo de Giberson que nos Estados Unidos, mesmo depois de todo esse tempo transcorrido, "metade da população pensa que a evolução é falsa e quer removê-la dos currículos das escolas públicas".
Darwin em seu livro concluiu que as espécies dividiram um antepassado comum, ao contrário do que lhe ensinaram, ou seja, de que Deus criara cada uma das espécies separadas. Para o cientista, as espécies surgiram ao longo dos tempos geológicos através da seleção dos mais aptos a cada um dos diversos ambientes. Estudos paleontológicos e genéticos, entre outros, evidenciam esses acontecimentos.
A genética moderna mostra, por exemplo, que no gênero Homo dois cromossomos se fundiram, o que não ocorreu na linhagem de outros primatas, acelerando a divergência ou diferenciação dessa população e resultando em nova espécie por meio da redução da chance de cruzamento entre essa nova população e outra espécie de primata.
Já na época de Darwin, muitos escritores procuravam conciliar a teoria científica com os preceitos bíblicos, interpondo ideias como a de "influências ocultas", que seriam responsáveis pelo ordenamento e nascimento das espécies, ou a da "contínua operação do poder Criador através dos tempos geológicos". Ao mesmo tempo, havia os que negavam que as espécies tivessem surgido por uma "lenta transmutação".
O que Darwin pré-estabeleceu estava rigorosamente muito distante disso. Darwin fez da natureza uma imutável sucessão de causas e efeitos materiais. Não havia nenhum providencialismo; as causa naturais não incluíram "a contínua operação da vontade de Deus". Para Darwin, Deus estava ausente; a natureza era autossuficiente.
A evolução trouxe à tona, evidentemente, a origem do homem, ou melhor, a transmutação do macaco em homem, o que causou inúmeras discussões. Por isso, é claro que o livro de Darwin despertou a ira do clero na época e a resposta não tardou. 25 bispos ameaçaram Darwin e seus seguidores com uma corte eclesiástica. Em resposta, Darwin afirmou que "um tribunal de bispos é o jardim florido do demônio".
Mas foi a perda de sua pequena filha Annie por causa da febre tifoide que representou a crucificação das esperanças de Darwin em Deus. Anos mais tarde, ele mesmo diria que esse período marcou o toque fúnebre de seu cristianismo. A partir disso, Darwin assume uma posição de descrente. Como ele escreveu em seu diário, passou a acreditar que "a mente humana, a moralidade e mesmo a crença em Deus eram artefatos do cérebro".
José Henrique Popp, doutor em Geociências, é professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
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