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Muito já se discorreu acerca da severa crise que paira sobre o país. Se descontado o viés militante da opinião dos atores diretamente envolvidos na trama, a visão que se pretende minimamente imparcial deve buscar abarcar os elementos que emanam de ambos os polos da dicotomia político-ideológica que se instalou no Brasil.

A conjuntura hodierna é, de fato, desconfortável. Do ponto de vista econômico, colhem-se os resultados decorrentes de uma série de equívocos – tanto macro quanto microeconômicos – cometidos desde o fim do governo Lula. A situação de hoje não seria tão sombria caso não tivesse sido potencializada por uma campanha eleitoral irresponsável e desonesta.

Se o cenário econômico é adverso, o contexto político não traz menos desalento. Uma mandatária fraca e sem credibilidade – a despeito do temperamento irascível e da rudeza no trato –, desprovida de qualquer resquício de carisma e dona de oratória claudicante, dificulta a arregimentação do apoio popular. O desprezo pela micropolítica e a aversão aos encargos da articulação com o Congresso Nacional completam o quadro de dificuldades.

Com base em quais fatos se propugna o impedimento?

Isso posto, faz-se imperioso e urgente rechaçar com veemência o movimento golpista que germina a passos largos em determinados setores da sociedade brasileira.

“O que o PSDB defende são novas eleições”, afirma o efusivo líder do partido no Senado. Seria uma postura trágica se não fosse apenas cômica. Não há exercício retórico que atenue o verdadeiro sentido desse eufemismo: trata-se do velho e arquiconhecido golpe de Estado. Com base em quais fatos se propugna o impedimento? Na crise econômica? Conquanto adversas, as condições da economia brasileira não configuram, nem de longe, o cenário catastrófico descrito pela oposição e repercutido con gusto pela grande mídia. Já enfrentamos percalços tão ou mais agudos que se nos apresentam na situação atual sem que se aventasse a via da interrupção democrática. Nas “pedaladas fiscais” e na reprovação das contas do governo julgadas pelo Tribunal de Contas da União? A que tribunal se referem? Ao TCU de Rui Barbosa e Serzedello Correa, ou ao TCU de José Múcio Monteiro e Valmir Campelo, figuras que dispensam predicados? Nos verdadeiramente graves e lesivos casos de corrupção? Em que dimensão vivem os arautos da lisura da política nacional? Denúncias de imoralidade nas vozes de Ronaldo Caiado e José Agripino Maia soam como Beethoven à oitiva dos justos. Enquanto se assiste à atuação de delinquentes profissionais no comando do Poder Legislativo como se fadas fossem, jamais se deveria aceitar tal proselitismo hipócrita. Não exercem outro papel a não ser o da meretriz que canta a castidade.

Não há justificativa plausível que embase o rompimento institucional. Do ponto de vista político, o governo ainda conta com o apoio formal de um condomínio de partidos no parlamento (11, especificamente), a despeito dos percalços por que passa essa relação. Sob o aspecto jurídico, o panorama é ainda mais turvo. Qualquer jurista a este fim inclinado encontraria elementos na doutrina para ratificar a “tecnicidade” de seu parecer. Ives Gandra Martins, professor da famigerada Escola Superior de Guerra (ESG), não nos deixa mentir.

Ainda assim, penso que seria louvável que o PT voltasse em breve para a oposição. Propício para o próprio partido, pedagógico para a infante democracia brasileira. Se quisermos robustecer as nossas instituições políticas, não podemos sucumbir ao discurso leviano da sereia udenista.

Mulher proba, de reputação reconhecidamente ilibada e com uma trajetória genuinamente dedicada à causa pública, a presidente da República leva uma típica vida de classe média em Porto Alegre. Senhora de suas ideias por ela tidas como cabais – muitas das quais discutíveis, é verdade –, chefia um governo que peca em inúmeros aspectos. Trata-se, apenas e tão somente, disso: um governo ruim. Tão ruim como tantos outros o foram na história do Brasil e de diversas outras democracias maduras. Nas parlamentaristas, dissolve-se o gabinete e elege-se um novo chefe de governo; nas presidencialistas, aguardam-se as próximas eleições.

À oposição republicana, portanto, que espere por 2018; aos golpistas-por-dever-do-ofício, oferecer-lhes-emos a resistência. Não passarão!

Ivan Salomão é professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
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