Desde dezembro de 2015, quando Eduardo Cunha admite pedido de impeachment da Presidenta Dilma Rousseff, diversas polêmicas tomaram o meio jurídico. Dentre elas, especialmente com o avanço processo, discute-se a possibilidade da Advocacia Geral da União conduzir a defesa da presidente.
O impeachment de Collor não nos dá a resposta por que, ainda que o ex-presidente tenha sido defendido por advogados particulares, a AGU, prevista na Constituição em 1988, só veio a ser criada em 1993, já no governo Itamar Franco.
O raciocínio é simples: agente público – seja o presidente da República - exerce suas atividades buscando o interesse público
Defesa institucional ou pessoal?
Até mesmo juristas contrários ao impeachment manifestaram-se contrariamente à possibilidade de defesa da presidente pela AGU
Leia artigo de Thiago Lima Breus, advogado e professor da Faculdade de Direito da UFPRA AGU é prevista no art. 131 da Constituição e sua função é representar “a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo”.
Embora, a função exista há muito tempo – desde o Procurador dos Nossos Feitos, do Brasil Colônia, passando pelo Procurador da Coroa e da Soberania Nacional, no Império e pelo Procurador Geral da República, até 1988 – a AGU, enquanto órgão de Estado, é uma novidade da Constituição de 1988, desafiando, ainda, debates sobre suas funções e possibilidades.
De todo modo, espera-se que a AGU – tendo a lei e, principalmente, a Constituição, como limites para a sua atuação – auxilie os demais órgãos de Estado na execução das atividades que lhes cabem. Assim, viabiliza, juridicamente, as políticas públicas conduzidas pelo governo. Os agentes públicos, escolhidos pelo povo, são os artífices dessas políticas públicas e, ao auxiliá-los, a AGU garante respeito aos princípios democrático e republicano.
Nessa esteira, a Lei 9.028/95, editada durante o governo FHC, atribui à AGU a função de defender os membros dos Poderes da República (não só o presidente, mas, parlamentares e magistrados, dentre outros) e demais agentes públicos. Segundo a lei, eles podem ser defendidos pela AGU mesmo após deixarem seus cargos, desde que desejem e que os fatos de que estejam sendo acusados tenham ocorrido no exercício da função pública.
O raciocínio é simples: agente público – seja o presidente da República ou um zelador– exerce suas atividades buscando o interesse público. Assim, defendê-lo é defender o exercício da função pública.
Em processos junto ao TSE, são vários os casos de atuação da AGU na defesa do presidente. Na Representação 872/DF, referência para esses casos, o PSDB pedia a condenação do presidente Lula por campanha eleitoral antecipada. O Ministro Marco Aurélio questionou a atuação da AGU e, por maioria, incluídos os Ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa, ficou estabelecido que, se o presidente atua como presidente e é demandado como presidente, a AGU pode defendê-lo.
No caso do impeachment, o raciocínio é o mesmo. O presidente que incorre em crime de responsabilidade poderá ser impedido. Para tanto, será processado. Mas, até que o processo termine e seja retirado, em definitivo, do cargo, continua presidente. Sendo assim, será defendido pela AGU.
Dilma Rousseff poderia escolher ser defendida por advogado privado – e, agora, diante de seu afastamento e nomeação de novo AGU, assim optou – mas tem direito de ser defendida pela Advocacia Geral da União. Negar esse direito seria prejulgá-la, mitigar seu direito de defesa e afastar a AGU da função de defender os representantes legitimamente escolhidos pelo povo.