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MST realizou 24 ocupações em 11 estados brasileiros, no dia 15 de abril de 2024, com mais de 20 mil famílias Sem Terra.
MST realizou 24 ocupações em 11 estados brasileiros, no dia 15 de abril de 2024, com mais de 20 mil famílias Sem Terra.| Foto: MST BA

O direito à propriedade é um direito fundamental e inviolável, garantido no artigo 5º da Constituição Federal. Afirmar isso pode soar como obviedade, mas é importante relembrá-lo diante das relativizações feitas a esse direito em diversos âmbitos do cenário brasileiro. Ele não é novidade do texto constitucional de 1988. Desde 1808, os portugueses trouxeram essa conceito ao cenário jurídico brasileiro, que foi sendo aprimorado e detalhado conforme as mudanças que vêm ocorrendo na sociedade ao longo do tempo.

Em caso de desrespeito a esse direito, o Código Civil aponta quais itens devem ser comprovados pelo autor que venha a requerer a reintegração de posse do imóvel: a posse do imóvel, a turbação ou esbulho (invasão) praticados pelo réu, a data da turbação ou esbulho, e a continuação ou perda da posse, respectivamente em caso de turbação ou esbulho.

Feitas as comprovações pelo autor, não devem restar dúvidas quanto aos seus direitos. Não se pode esquecer, é claro, a função social da propriedade, também prevista no artigo 5º da Constituição. Porém, não é possível que seja aceita qualquer argumentação com uma visão simplista sobre esse tema. É fato que existem pessoas em situação de extrema vulnerabilidade, que precisam ter garantido o direito à moradia. Mas esse direito não pode ser efetivado ao se enfraquecer os direitos de outras pessoas.

No caso dos imóveis, a situação é extremamente complexa. Famílias que muitas vezes enfrentam dissabores de toda espécie – como problemas de saúde, perdas familiares, revezes financeiros e trâmites onerosos e nem sempre pacíficos de inventários – podem se ver temporariamente sem plenas condições de habitar em determinado bem. Nem por isso, tal imóvel deixa de ser relevante para seus proprietários ou perde sua função social.

A verdade é que a legislação brasileira pouco se aprofunda sobre o que de fato é a função social e o que baliza seu cumprimento. Há na doutrina e na jurisprudência posições que se colocam conforme as visões e as necessidades dos envolvidos. Mas não há dúvidas de que a posição do legislador, ainda que gere debates complexos, uma vez definida, viria a dirimir muitas incertezas a respeito do tema.

Enquanto não há parâmetros certeiros, a vulnerabilidade de uns não pode ser motivação para reduzir direitos de outros. Não se trata aqui de menosprezar as diferentes necessidades ou ignorar os problemas sociais do país. A questão é que as soluções precisam vir pelos caminhos acertados. Políticas sociais e gestão pública devem dar conta de garantir direitos sociais como o de moradia. Não serão decisões pontuais do Judiciário de subtração da propriedade alheia que resolverão esse desafio.

Também é preciso haver uma visão mais macro no sentido de que a insegurança jurídica impacta toda a sociedade. Ao se relativizar o direito à propriedade de alguns sob justificativas questionáveis, abre-se caminho para que outros direitos sejam relativizados e até aviltados de maneira imponderada. O tema é delicado e, à primeira vista, pode parecer que as necessidades dos mais vulneráveis podem justificar qualquer medida mais imediatista. Mas a realidade é que, uma vez que a insegurança jurídica impere, cedo ou tarde, também os mais vulneráveis que sofrerão seus impactos.

Alan Bousso, advogado, sócio do Cyrillo & Bousso Advogados e mestre em Direito Civil.

Conteúdo editado por:Jocelaine Santos
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