É notório que os orçamentos públicos – federal, estaduais e municipais – são formados exclusivamente pelas contribuições de todos os cidadãos que, dia após dia, abastecem os cofres governamentais com parte do produto obtido na árdua labuta. Todos pagamos tributos – direta ou indiretamente – cada vez que, por exemplo, fazemos uma compra ou contratamos um serviço, desde as ações mais simples (como adquirir um pãozinho ou tomar um ônibus) até as mais sofisticadas operações comerciais, financeiras, industriais e de prestação de serviços.
O que muita gente ainda não sabe é que significativa fatia dos orçamentos públicos – formados por nossas contribuições compulsórias – é carreada para cobrir os déficits atuariais do regime próprio de previdência dos servidores do Estado (em sentido largo).
Os servidores brasileiros que ingressaram no serviço público até o fim de 2003 ainda têm direito à integralidade e paridade de seus benefícios previdenciários com sua última remuneração e com os avanços obtidos por aqueles que permanecem na ativa. A Emenda Constitucional 41, de 19 de dezembro de 2003, pôs fim a tal privilégio. Todavia, quase metade dos servidores ativos no Brasil ainda faz jus a esse maná. Isso sem falar daqueles que sobrevivem na inatividade, que ainda são muitos. Os que iniciaram suas carreiras públicas a partir da vigência da já mencionada EC 41 terão seus benefícios previdenciários calculados pela média de suas remunerações. Estes formam um número ligeiramente superior àqueles do primeiro grupo, considerando apenas os servidores em atividade.
A União, os entes federados (estados e municípios) e os servidores contribuem para a formação dos valores necessários para honrar o pagamento dos benefícios com alíquotas previstas em lei, que incidem sobre suas folhas de pagamento ou remunerações, respectivamente. Ocorre que pelo modelo adotado, de pacto intergeracional, “a conta não fecha”, como se diz no jargão popular. Não são poucos os casos de servidores públicos que percebem benefícios por mais tempo do que contribuíram durante a vida ativa. O pior é que contribuíram com porcentuais de suas remunerações, mas auferem os benefícios em sua completude. Dentro da legalidade – é verdade. Todavia, trata-se de uma conta pesada que o cidadão contribuinte não precisa nem merece suportar.
Não vai aqui nenhuma agressão aos servidores públicos que, em sua grande maioria, prestam inestimáveis serviços à comunidade. Convido o leitor a pensar nos professores que amam a seus alunos mais do que a ideologias, nos profissionais de saúde que se preocupam mais com seus pacientes do que com o vil metal, naqueles que cuidam da nossa segurança, da justiça, da manutenção dos logradouros públicos e tantos outros que fazem possível a vida em sociedade.
Mas essa mesma sociedade não aceita mais pagar a conta que no título deste artigo chamei de iceberg. O déficit atuarial dos servidores públicos de todas as esferas deste pobre Brasil monta em cifra superior a R$ 8 trilhões, com viés de crescimento. Não dá mais para tolerar tal situação.
Como solução, de médio para longo prazo, entra em campo a previdência complementar fechada já adotada pela União (nas Funpresps) e implantada na maioria dos estados (nas PrevComs) e em uma minoria de municípios. A adoção é compulsória nos termos do disposto na Emenda Constitucional 103/2019, que fixou o prazo de dois anos para os gestores públicos (governadores e prefeitos) introduzirem o sistema híbrido de proteção social de seus respectivos servidores. Tal prazo findou-se em 11 de novembro do ano passado, tendo sido solene e impunemente ignorado por muitos entes federados.
O déficit atuarial dos servidores públicos de todas as esferas deste pobre Brasil monta em cifra superior a R$ 8 trilhões, com viés de crescimento. Não dá mais para tolerar tal situação
O município de Curitiba implantou a previdência complementar fechada já no ano de 2018, antes da já mencionada emenda constitucional, criando a CuritibaPrev, sua fundação com finalidade específica, que conta com 1.451 servidores participantes, sendo que apenas 73 deles têm remuneração acima do teto do INSS. Além dos benefícios individuais inerentes ao sistema escolhido, a adesão à previdência complementar deste pequeno grupo já gerou uma economia da ordem de R$ 767 mil aos cofres municipais. Levando em conta todas as contribuições previdenciárias – passadas e futuras – até a data estimada para as aposentações desse reduzido conjunto de servidores, o valor presente da economia projetada para o município monta em R$ 178 milhões.
O município vem trabalhando com afinco para ampliar a base de adesão. Não é difícil esboçar que, quando a CuritibaPrev tiver 730 servidores participantes com remuneração acima do teto do INSS, a economia projetada será da ordem de R$ 2 bilhões. Tal valor corresponde aproximadamente a 20% do orçamento do município e a 16% do déficit atuarial do Instituto de Previdência dos Servidores do Município de Curitiba (IPMC). O fantasma do déficit atuarial e dos aportes extraordinários que tanto oneram o cofre municipal (e, por consequência, todos os seus cidadãos) será definitivamente exorcizado.
Além disso, como Curitiba não é uma cidade egoísta, o município oferece a estrutura da CuritibaPrev a todos os entes federados que a ela queiram aderir, através de sua chancela “APREV do Servidor”. Até agora, os municípios de Pinhais, Piraquara e Campina do Simão, no Paraná, e Lucas do Rio Verde, no Mato Grosso, já compunham o grupo de patrocinadores da fundação criada por Curitiba. Trata-se de uma jovem e ainda pequena Fundação de Previdência Complementar. Mas, conforme demonstram os números acima apresentados, tem uma enorme energia potencial para crescer e oferecer excelentes resultados econômicos e sociais aos servidores, à administração e aos cidadãos de Curitiba e de tantas outras cidades.
A CuritibaPrev é uma realidade com visão de futuro, o que, aliás, é a marca da gestão do prefeito Rafael Greca.
José Luiz Costa Taborda Rauen é advogado, professor da PUCPR e diretor-presidente da CuritibaPrev.