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Com o objetivo de garantir efetividade à competência do Congresso de legislar, externei interpretação constitucional segundo a qual as medidas provisórias (MPs) continuarão trancando a pauta das sessões ordinárias e a votação dos projetos de lei. Não trancarão, porém, a pauta das sessões extraordinárias, nas quais poderão ser votadas as emendas à Constituição, leis complementares, decretos legislativos e resoluções, dentre outras.

Os fundamentos que apresentei para apoiar minha interpretação foram preliminarmente aprovados pelo Supremo Tribunal Federal. O primeiro deles é de natureza meramente política. A Câmara tem sido criticada por ter, praticamente, paralisado as votações devido às medidas provisórias. Atualmente, várias MPs trancam a pauta dos nossos trabalhos. Em um critério temporal bastante otimista, essa pauta só seria liberada no final de maio e, sem uma solução que efetivamente garanta o destrancamento, correríamos o risco de passar este ano sem conseguir levar adiante as propostas que tramitam nesta Casa que não sejam as medidas provisórias.

Fechada a explicação de natureza política, ofereço as fundamentações de natureza jurídica que apoiam minha decisão. A primeira é que a Constituição de 1988 inaugurou, política e juridicamente, o Estado Democrático de Direito, tendo a Carta nascido como fruto do combate ao autoritarismo. Surgiu para igualar os poderes e, portanto, para impedir que um deles tivesse uma atuação política e juridicamente superior a de outro, o que ocorria no período anterior.

A Constituição, logo na sua abertura, define o Brasil como um Estado Democrático de Direito. Bastaria dizer "Estado Democrático" ou "Estado de Direito", mas repisou: "É um Estado Democrático de Direito." Na sequência, estabeleceu uma igualdade absoluta entre os poderes do Estado. Ou seja, eliminou a ordem jurídica anterior, que dava prevalência ao Poder Executivo e, no particular, ao presidente da República.

Ao distribuir as competências, a soberania popular expressada na Constituinte estabeleceu funções distintas para órgãos distintos. Para dizer uma obviedade, o Executivo executa, o Legislativo legisla e o Judiciário julga. A exceção a esse princípio é a edição de medidas provisórias pelo Poder Executivo.

Toda vez que há uma exceção, essa interpretação não pode ser ampliativa. Ao contrário, toda e qualquer exceção só pode ser interpretada restritivamente. No artigo 62 da Constituição verificamos o seguinte: que a medida provisória, se não examinada no prazo de 45 dias, sobresta todas as demais deliberações legislativas na Casa em que estiver tramitando. Surge a pergunta: de que deliberação legislativa trata o texto constitucional?

Faço uma consideração genérica. A interpretação mais prestante na ordem jurídica do texto constitucional é a sistêmica. Só é possível desvendar os segredos de um dispositivo constitucional se este for encaixado no sistema. Na interpretação literal – a mais pedestre das interpretações – "todas as deliberações legislativas" significaria que nenhuma delas pode ser objeto de análise. Mas não é isso o que diz o texto. Em uma interpretação sistêmica, a MP não poder versar sobre matéria de lei complementar, emenda constitucional, decreto legislativo ou resolução. Há vedação expressa no texto constitucional.

Em face dessas circunstâncias, a interpretação que se dá à expressão "todas as deliberações legislativas" refere-se a deliberações legislativas ordinárias. Ademais, mesmo algumas leis ordinárias estão excepcionadas. O artigo 62, inciso I, ao tratar das leis ordinárias que não podem ser objeto de medida provisória, estabelece as leis ordinárias sobre nacionalidade, cidadania e outros tantos temas. Então, nessas matérias também não há trancamento da pauta. Isto é o que o sistema constitucional nos diz.

Essa interpretação está, no momento, submetida à análise do Supremo Tribunal Federal. Ressalto, porém, que estou fortemente convencido desse entendimento. Com essa resolução, pretendo "levantar a cabeça" do Poder Legislativo e mostrar que temos condições de dar uma interpretação constitucional consequente, que nos permita dar efetividade ao processo legislativo. Reconheço a ousadia dessa decisão, mas acredito que o Brasil e o Legislativo estão precisando dessa ousadia.

Michel Temer é presidente da Câmara dos Deputados.

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