São vários e curiosos os significados da expressão “votação histórica” ocorrida na Câmara para aceitar a abertura de processo contra a presidente Dilma Rousseff.
Histórica por ser o início da deposição da presidente do maior partido de esquerda da América Latina, com seu discurso que sempre prometia riqueza e fartura fácil e luta contra os poderosos. Histórica pelo PT possuir livre docência em pedir impeachment de seus adversários e agora ter de inventar adversários e interessados malévolos para negar que o povo rejeitou o partido muito antes da oposição partidária, tanto que precisou fazer pressão nos deputados que se aferravam até o último segundo ao governismo antes de atender o que o povo pedia.
O impeachment ainda não impede a ideologia de quem ensina nossas crianças com ideologias, e não fatos
Histórica por se tratar da presidente com a pior avaliação mundial – é de se crer que haja ditadores mais bem avaliados do que a petista. Histórica – e a ironia aqui exige muito mais que nossos historiadores estão dispostos a captar, presos na gaiola conceitual da ideologia – por ser o partido dos professores de História, por ser o partido da ideologia que se apavonava ser o próprio progresso, o futuro que se fez carne, a vitória final dos pobres e explorados contra os patrões.
É a crença trotskysta, uma das correntes fundadoras e dominantes no Partido dos Trabalhadores, de que os “burgueses” seriam jogados na “lata de lixo da história”. A picaretagem de Trotsky e a logorreia petista tiveram fins diversos, Celso Daniel e Toninho do PT à parte, mas ambos foram parar justamente na lata de lixo da história – uma presença incômoda, sempre a nos lembrar da escatologia daquilo que não mais possui valor.
A narrativa histórica, observada pelo cabresto da ideologia da luta de classes, cada vez com outra roupagem para a mesma clave de interpretação, simplesmente cansa da simplicidade de crer que pobres devem lutar contra ricos, como se fossem inimigos, como se desejassem coisas opostas.
O que despertou os olhos brasileiros foi a visão de que tal historieta precisa de subterfúgios como a “corrupção do bem”, o roubo para o Partido, confundido com o próprio povo quando tenta subir ao poder, confundido com o próprio futuro em suas ilações, confundido com o próprio Estado quando domina a máquina.
O que chama atenção em um país com nossa tradição é, curiosamente, aquele rico empresário que, em vez de concorrer no mercado, prefere o dinheiro fácil do contrato com o governo. Nada pior aos olhos da nação, e fraqueza que o próprio PT explora, fingindo nada ter a ver com os delatores em quem Dilma “não confia”. Numa tradição de ensino de História marxista-trotskysta, são chamados de “capitalistas”. Qualquer um fora disso sabe que eles são o vício do Estado dirigente e controlador da economia do PT e da esquerda.
O impeachment ainda vai ao Senado, e certamente a AGU, também confundindo União com Partido, usará uma decisão monocrática de Lewandowski para tentar barrar o impeachment. Mas o principal era a Câmara. Agora a bola de neve começou a rolar montanha abaixo.
Resta cuidar de como contarão a história. O impeachment da presidente ainda não impede a ideologia de quem ensina nossas crianças com ideologias, e não fatos.
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