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Desde as primeiras máquinas agrícolas que revolucionaram as práticas nas lavouras décadas atrás, o setor agrícola não parou de se reinventar com a chegada de novos recursos. Atualmente, drones, sensores, GPS, robótica e automatização estão entre as ferramentas mais comentadas e desejadas, proporcionando uma série de benefícios para os proprietários rurais. Além disso, as redes sociais também têm desempenhado um papel fundamental como ferramenta de negócios, encurtando distâncias entre fornecedores e compradores e dinamizando o mercado.
Saímos da agricultura de tração animal, focada na subsistência, a 1.0, passamos pela implementação de máquinas e início de produção em grande escala na 2.0. Dos anos 1990 até 2010, introduzimos o GPS, agricultura de precisão, e a sustentabilidade começou a ganhar espaço com a agricultura 3.0, até que chegamos ao nosso atual momento, a 4.0, dando espaço à digitalização. Mas o setor já vislumbra a próxima etapa, focando em maiores avanços tecnológicos e ainda mais eficientes: a agricultura 5.0, com operações cada vez mais autônomas com uso de machinelearning, robótica, inteligência artificial.
Quando a gente fala em transformação digital não estamos levando em conta apenas a incorporação da tecnologia.
No entanto, mesmo com tantos avanços notáveis, um desafio permanece: a situação de conectividade no campo hoje no Brasil, é equivalente à década de 1970 quanto ao tema de iluminação ou provimento de energia elétrica, ou seja, estamos numa situação extremamente crítica. De acordo com os dados mais recentes do Ministério da Agricultura, mais de 84% dos produtores rurais utilizam pelo menos uma tecnologia digitalcomo ferramenta de apoio na produção agrícola. Mas apenas 30% do espaço agrícola brasileiro possui algum nível de cobertura e a maioria dos produtores rurais só tem conexão na sede da sua propriedade, o que inclui soluções de internet por rádio e satélite ou rede 3G. Essa disparidade representa um desafio gigantesco para a agricultura, que impacta diretamente na produtividade e no desenvolvimento do setor.
Uma das razões para essa diferença marcante reside na própria estrutura do mercado agropecuário brasileiro. No país, existem duas dinâmicas principais de produção: aquelas de empreendimentos de baixo rendimento e aquelas que estão inseridas no mercado global. Dos cinco milhões de estabelecimentos agropecuários no Brasil, três milhões, ou seja, 60%, tendem a enfrentar dificuldades em termos de produtividade.
Por outro lado, apenas 1% das propriedades rurais estão inseridas na dinâmica global, caracterizadas por ganhos significativos de produtividade, aumento de escala e a incorporação de tecnologia de última geração. Esses grandes proprietários de terra têm acesso a recursos tecnológicos de ponta, incluindo sistemas de monitoramento por satélite, máquinas agrícolas altamente automatizadas e sistemas de gestão digital. Os pequenos e médios produtores enfrentam dificuldades para adotarem essas tecnologias, devido ao elevado investimento inicial e a complexidade técnica. Daí surge o importante papel do poder público como facilitador da democratização da internet rural.
Considerando que 80% dos estabelecimentos rurais são propriedades de agricultura familiar e que pelo menos 44% da área rural brasileira é de produtores médios e pequenos, é fundamental democratizar a conectividade e o acesso a tecnologias digitais para que efetivamente seja possível atender ao desafio de produzir cada vez mais. Assim será possível atender ao crescimento exponencial por alimentos que se apresenta, de maneira mais sustentável, preservando recursos naturais e aumentando a qualidade de vida de toda a população rural brasileira.
Nem operadoras nem o governo federal têm estimativa de quanto custaria, num cenário de sonhos, conectar toda a área agrícola brasileira, apontada em 84 milhões de hectares no Levantamento Sistemático de Produção Agrícola, do IBGE. Mas simulação feita por entidades privadas sugere que tal investimento poderia chegar a R$ 7,98 bilhões.
E quando a gente fala em transformação digital não estamos levando em conta apenas a incorporação da tecnologia. Há que se considerar a transformação da atividade e junto a isso o treinamento e a capacitação das pessoas. É essa abordagem holística que se mostra mais do que necessária quando a gente se volta para a agricultura familiar.
Pontuado tudo isso, fica evidente que a conectividade em propriedades rurais – e muitas vezes remotas – é uma das grandes prioridades do campo. E todos ganharemos com isso.
Lucas Bressanin é advogado e dirige a Fundação ITESP, a empresa do governo paulista responsável pelo trabalho de regularização fundiária em São Paulo.