Cada vez mais a importância e a efetividade da educação superior têm sido questionadas, e inúmeros desafios para o futuro são apontados. Dentre esses desafios, podemos destacar a aplicação prática insuficiente dos cursos; a dificuldade das novas gerações de enxergar propósito no modelo de ensino-aprendizagem utilizado nas instituições de ensino; e o desalinhamento das demandas do mundo do trabalho com o que é estudado nas instituições. Mas onde está o problema? Nas instituições, que não ensinam o que e/ou como deveriam? Nos estudantes, que não entendem o que realmente é importante? Ou na sociedade, mais especificamente no mercado de trabalho, que busca resolver as carências da formação profissional por conta própria?
Esses três “personagens”, em um presente bem próximo dos nossos olhos, vivem boa parte do tempo separados, buscando resolver as suas dores isoladamente e cada vez mais distantes de uma educação que tenha futuro. Para tratarmos do tema, é preciso entender um pouco melhor como cada persona vive o seu presente.
A primeira persona é a das instituições. Elas precisam, sim, mudar a forma de ensinar. Muito do que acreditávamos ser imprescindível e que era reproduzido em numerosos slides na sala de aula (e com alguns conteúdos de pouca aplicação e despejados para os alunos) hoje pode ser obtido por múltiplas fontes, como as plataformas digitais. A forma de ensino menos participativa e com foco principal na teoria, além de propiciar um baixo grau de aprendizagem, afasta o aluno das aulas e gera grande dispersão. Mas esse problema pode se transformar em uma grande oportunidade, desde que a situação nos incomode e gere a compreensão de que o tempo das aulas pode ser significativamente redistribuído com o uso de meios digitais de conteúdo ‒ o que deve resultar em mais tempo para trazer desafios reais para os alunos. Entre esses desafios, estão habilidades que eles devem desenvolver, como exercitar o trabalho em equipe, a comunicação assertiva e a resolução de problemas.
Não estou destacando o ensino híbrido ou outras ações com foco na redução de carga horária; ou afirmando que a tecnologia por si só resolve os problemas da educação superior. Estou enfatizando, sim, a utilização eficaz do tempo de estudo. Acrescento, ainda, que precisamos incentivar o índice de leitura de nossos alunos de forma a propiciar a autonomia para o saber e a capacidade de aprendizagem contínua.
A segunda persona é a dos estudantes. Colocar a culpa em alguém ou alguma coisa infelizmente é um caminho muito comum para dar resposta a algo que não está indo bem. As afirmações “a nova geração não sabe o que quer” ou “os jovens não dão valor para a educação” acabam sendo usadas como justificativas para o desinteresse, o baixo desempenho e a evasão dos alunos. Na verdade, são grandes oportunidades para entendermos como pensa a nova geração, quais habilidades eles desenvolvem com maior facilidade por terem nascido na “geração da internet” e como essas capacidades podem ajudar a conquistar outras mais frágeis, como a inteligência social, que foi potencializada pelo isolamento durante a pandemia, e a resiliência para tratar com situações que fogem da sua zona de conforto. Pesquisas apontam que os jovens precisam de propósito para fazer algo, ou seja, precisam entender claramente a aplicação e o porquê de estarem executando uma tarefa, e não simplesmente a executarem porque vale nota ou porque é motivo de reprovação. Por outro lado, os estudantes também precisam compreender que a educação superior demanda uma mudança de comportamento e que é preciso estarem abertos para novos saberes que devem propiciar uma formação de real qualidade.
Por fim, a terceira persona, a do mercado de trabalho. É notório que, com o avanço tecnológico e o aumento da concorrência, as organizações avançaram nas suas práticas de trabalho. Consequentemente, o descompasso das competências desenvolvidas nas instituições com o que realmente é praticado nas organizações dos diversos setores aumentou consideravelmente nas duas últimas décadas. Para sanar esse problema, não basta que as instituições obtenham informações sobre as práticas e os desafios do mercado e coloquem os alunos para ler casos já ocorridos. É preciso que vivam esses desafios junto com os alunos, trazendo as organizações para dentro das instituições, e vice-versa.
O futuro da educação superior está diante de um grande presente, pois não temos uma bela colheita amanhã sem semear hoje
A união dos três personagens do presente da educação superior pode gerar um real valor à educação; dessa forma, teríamos uma educação de fato inovadora no futuro: não por entregar mais rápido ou entregar menos, mas por contribuir para a formação de competências que potencializam as carências das novas gerações e que realmente sejam úteis para a aplicação na vida e no mercado de trabalho.
O futuro da educação superior está diante de um grande presente, pois não temos uma bela colheita amanhã sem semear hoje. Não podemos esperar um futuro da educação melhor sem mudar o hoje. Assim, precisamos unir os três presentes: instituições de ensino; estudantes atuais e futuros; e a sociedade que participa desse ecossistema.
Por fim, sugiro sete ações que podem contribuir para unir os três presentes e obtermos uma educação superior mais inovadora: entender quais capacidades são realmente necessárias à formação integral do aluno; não criar cursos para o mercado de trabalho, e sim junto com o mercado de trabalho; ter a tecnologia como um meio de transformação, e não como a própria solução; compreender que habilidades comportamentais precisam ser desenvolvidas de forma multidisciplinar; entender que a inovação não é uma corrida individual, e sim uma caminhada em equipe com os três personagens do presente; realizar pequenas mudanças e de forma constante, o que vai permitir resultados mais duradouros; e medir os resultados de cada mudança e comemorar as conquistas em conjunto com os três personagens do presente, aprendendo com os resultados de forma a gerar melhorias contínuas na aprendizagem.
Everton Drohomeretski é pró-reitor de Pesquisa, Ensino e Extensão da FAE Centro Universitário.
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